António Pedro Dores*
A democracia, há quem diga, deixará aos poucos de ser possível. O argumento é: a democracia precisa de crescimento económico, de um jogo de soma positiva, de exploração acelerada do mundo e da humanidade em favor de uma sociedade que assim se poderá dar ao luxo de exercitar a liberdade. De facto, com o abrandamento do crescimento económico no Ocidente, a partir da crise do petróleo de 73, as empresas apoiadas pelos Estados Unidos desenvolveram a estratégia de globalização, que significa o alargamento da base de exploração a todo o planeta e um abandono das políticas nacionalistas de legitimação. As mesmas taxas de lucro podem suportar o crescimento da acumulação se houver mais transacções. Em tais circunstâncias, o aumento dos lucros passa a ser possível também pela negociação das deslocalizações e pelo aumento da exploração dos locais e povos mais desprotegidos da Terra. Tais lucros, todavia, não são para serem divididos socialmente: são tomados como obra de gestão de visionários iluminados e antidemocráticos, num tempo em que todos os ocidentais aspiram a ser ricos para além do possível, como se os juros à D. Branca pudessem ser pagos à casta de dirigentes bem informados e bem colocados, sem risco.
A democracia, de facto, quem não o pressente?, está decadente. Há quem confunda democracia com política. Mas esta última, estando apropriada por uma classe política corruptível, gestora de gestores, centrada nos lucros financeiros, aspirante a integrar a classe dominante global, odiando os povos que trata como públicos e embrutece com espectáculos (dos meios de comunicação até às escolas e universidades), desprezando os velhos que lhes aparecem apenas como alvos de exploração dos sistemas de saúde, é a política, dizia, que comanda globalmente os destinos da humanidade. Porque, manifestamente, se fosse apenas a economia já tudo tinha implodido.
O capitalismo, por definição, não cuida dos problemas sociais nem respeita planeta ou humanidade. É a política que o fará ou não, democraticamente ou não, no respeito dos Direitos Humanos ou não.
A seguir à II Grande Guerra os Direitos Humanos fizeram o seu curto caminho institucional em nome da dignidade humana de cada pessoa. Foi essa política exígua desenvolvida após a derrota do colonialismo, nos anos 60, que serviu de mote ao lado vencedor da Guerra Fria. A capacidade de mobilização da liberdade de iniciativa económica para organizar a globalização capitalista revelou-se uma vantagem comparativa que conquistou os próprios gestores do socialismo real, que o auto-liquidaram para correr atrás do paraíso neo-liberal, com milhões de vítimas directas.
Eufóricos com a nossa vitória de Pirro, não quisemos dar-nos conta dos custos de tal operação, nomeadamente a expansão a Leste da União Europeia. Nos dias de hoje é já claro que os poderes centrais europeus (como os norte-americanos, os primeiros a nomear a Nova Europa) preferem descartar-se do Sul – os chamados PIGS – e explorar as competências e determinação dos países de Leste.
Quais são, então, os nossos activos, em Portugal? Serão os nossos gestores de gestores nos diversos postos da administração de Bruxelas? Ou será a nossa cultura universalista? Será o nosso sistema financeiro periférico, oligárquico e corruptível? Ou será um povo treinado para compreender os ventos da história e para reconhecer o valor de terceiros? Serão as grandes obras públicas? Ou será a mobilização dos recursos em rede estabelecidos ao longo do último meio milénio por todo o mundo, organizados para nos assegurar paz?
A União Europeia respeita-nos como respeita os seus velhos. Quando tiver tempo, logo tomará alguma atenção. Nós próprios estamos a seguir essa via de isolamento social dos indivíduos em busca de rendimentos. Em Portugal as políticas de habitação obrigam à fixação das pessoas longe dos seus locais de trabalho, gastando parte importante do dia em transportes para animar esse sector e desvalorizar todos os outros – porque as pessoas cansadas rendem menos que as pessoas despertas. Toda a vida social é substituída pelas rádios dos automóveis e pelas televisões das casas. O envelhecimento da população é alarmante, bem como a intolerância crescente, bem espelhada nas políticas de segurança, justiça, imigração e pobreza.
Esta é uma sociedade em vias de suicídio, dadas as políticas anti-sociais em vigência, nomeadamente as de destruição do Estado Social – por alegadamente não haver alternativa que não seja a de organizar a substituição massiva dos jovens que não existem por imigrantes, a que alegadamente a população resistiria por efeito da xenofobia. A demografia, efectivamente, é um dos busílis da política actual: as instituições desenvolvem políticas contra a xenofobia e o racismo, como contra a pobreza, como políticas “sociais” para minimizar (e mascarar) as políticas dominantes de exclusão social, de preparação para e provocação da guerra social inter-étnica global, interna e exterior por igual, nos bairros classificados como problemáticos ou contra países infiéis. São, de facto, políticas policiais contra os jovens do sexo masculino que sofrem mais directamente as contradições das políticas vigentes (por exemplo, sabendo ser as suas vidas destinadas a serem piores do que a de seus pais e ao serviço dos mesmos patrões) e que podem ter forças para desestabilizar os poderes instituídos. Tudo se passa como se a consciência da própria ganância antecipasse a consciência dos excluídos da ilegitimidade moral e política das práticas de gestão dominantes, que chegam a enojar os próprios gestores, como aqueles que apareceram em 2008 a reclamar contra a imoralidade de Wall Street e das práticas bancárias. Muitos desses, com apoios políticos fortes, mantém hoje as mesmas práticas que condenaram.
Tal como, há mais de 500 anos, Portugal foi capaz de fazer reverter as dinâmicas da guerra santa da altura a favor das Descobertas, poderemos também assumir hoje o legado dos nossos antepassados e viver da política e do Mundo. Não é esse o nosso destino, mas antes não apenas uma mais valia que herdámos como também a melhor janela de oportunidade para viver melhor, connosco e com o mundo. Não é uma proposta para santos, pois as misérias humanas foram testemunhadas por portugueses provavelmente mais do que por qualquer outro povo no mundo. É um trabalho de tecedura para o qual poderemos levar a estranha e ambígua bandeira dos Direitos Humanos, sinal em vias de ser renegado pelo Ocidente, que o usou também contra os interesses estratégicos de Portugal (e Brasil) durante o século XIX, aquando da substituição da escravatura pelo salariato.
Direitos Humanos em Angola, Guiné. Moçambique, S.Tomé e Príncipe, Timor e no Brasil podem bem ser marcas da presença portuguesa não contra mas a favor dos povos, intransigentemente contra os gestores de gestores que se tornaram a classe política dominante. Com tais países será possível refazer como melhor se entender a nossa demografia, fraternalmente. E acompanhar (com a mesma fraternidade) a emergência dos países emergentes, proporcionando-lhes a possibilidade de apoiarem uma experiência política democrática adaptada aos tempos – construindo um jogo de soma positiva para Portugal que os “mercados” estão prontos a negar, como se tem visto.
Uma tal perspectiva não é compatível com a política da mentira ou sequer da política “para inglês ver” que foi a sua predecessora. Precisamos de políticas de convicção, testadas democraticamente e apoiadas em princípios de igualitarismo, de serviço público (na administração, no terceiro sector e no sector privado) e no liberalismo judicial. Essas, sim, farão a diferença, porque serão mobilizadoras dos portugueses e dos seus amigos para novos horizontes de convivialidade mais próximos dos ideias humanitários do que a derrocada da civilização ocidental no Ocidente e a sua réplica exploradora na China e nos países emergentes faz antever.
A democracia, de facto, quem não o pressente?, está decadente. Há quem confunda democracia com política. Mas esta última, estando apropriada por uma classe política corruptível, gestora de gestores, centrada nos lucros financeiros, aspirante a integrar a classe dominante global, odiando os povos que trata como públicos e embrutece com espectáculos (dos meios de comunicação até às escolas e universidades), desprezando os velhos que lhes aparecem apenas como alvos de exploração dos sistemas de saúde, é a política, dizia, que comanda globalmente os destinos da humanidade. Porque, manifestamente, se fosse apenas a economia já tudo tinha implodido.
O capitalismo, por definição, não cuida dos problemas sociais nem respeita planeta ou humanidade. É a política que o fará ou não, democraticamente ou não, no respeito dos Direitos Humanos ou não.
A seguir à II Grande Guerra os Direitos Humanos fizeram o seu curto caminho institucional em nome da dignidade humana de cada pessoa. Foi essa política exígua desenvolvida após a derrota do colonialismo, nos anos 60, que serviu de mote ao lado vencedor da Guerra Fria. A capacidade de mobilização da liberdade de iniciativa económica para organizar a globalização capitalista revelou-se uma vantagem comparativa que conquistou os próprios gestores do socialismo real, que o auto-liquidaram para correr atrás do paraíso neo-liberal, com milhões de vítimas directas.
Eufóricos com a nossa vitória de Pirro, não quisemos dar-nos conta dos custos de tal operação, nomeadamente a expansão a Leste da União Europeia. Nos dias de hoje é já claro que os poderes centrais europeus (como os norte-americanos, os primeiros a nomear a Nova Europa) preferem descartar-se do Sul – os chamados PIGS – e explorar as competências e determinação dos países de Leste.
Quais são, então, os nossos activos, em Portugal? Serão os nossos gestores de gestores nos diversos postos da administração de Bruxelas? Ou será a nossa cultura universalista? Será o nosso sistema financeiro periférico, oligárquico e corruptível? Ou será um povo treinado para compreender os ventos da história e para reconhecer o valor de terceiros? Serão as grandes obras públicas? Ou será a mobilização dos recursos em rede estabelecidos ao longo do último meio milénio por todo o mundo, organizados para nos assegurar paz?
A União Europeia respeita-nos como respeita os seus velhos. Quando tiver tempo, logo tomará alguma atenção. Nós próprios estamos a seguir essa via de isolamento social dos indivíduos em busca de rendimentos. Em Portugal as políticas de habitação obrigam à fixação das pessoas longe dos seus locais de trabalho, gastando parte importante do dia em transportes para animar esse sector e desvalorizar todos os outros – porque as pessoas cansadas rendem menos que as pessoas despertas. Toda a vida social é substituída pelas rádios dos automóveis e pelas televisões das casas. O envelhecimento da população é alarmante, bem como a intolerância crescente, bem espelhada nas políticas de segurança, justiça, imigração e pobreza.
Esta é uma sociedade em vias de suicídio, dadas as políticas anti-sociais em vigência, nomeadamente as de destruição do Estado Social – por alegadamente não haver alternativa que não seja a de organizar a substituição massiva dos jovens que não existem por imigrantes, a que alegadamente a população resistiria por efeito da xenofobia. A demografia, efectivamente, é um dos busílis da política actual: as instituições desenvolvem políticas contra a xenofobia e o racismo, como contra a pobreza, como políticas “sociais” para minimizar (e mascarar) as políticas dominantes de exclusão social, de preparação para e provocação da guerra social inter-étnica global, interna e exterior por igual, nos bairros classificados como problemáticos ou contra países infiéis. São, de facto, políticas policiais contra os jovens do sexo masculino que sofrem mais directamente as contradições das políticas vigentes (por exemplo, sabendo ser as suas vidas destinadas a serem piores do que a de seus pais e ao serviço dos mesmos patrões) e que podem ter forças para desestabilizar os poderes instituídos. Tudo se passa como se a consciência da própria ganância antecipasse a consciência dos excluídos da ilegitimidade moral e política das práticas de gestão dominantes, que chegam a enojar os próprios gestores, como aqueles que apareceram em 2008 a reclamar contra a imoralidade de Wall Street e das práticas bancárias. Muitos desses, com apoios políticos fortes, mantém hoje as mesmas práticas que condenaram.
Tal como, há mais de 500 anos, Portugal foi capaz de fazer reverter as dinâmicas da guerra santa da altura a favor das Descobertas, poderemos também assumir hoje o legado dos nossos antepassados e viver da política e do Mundo. Não é esse o nosso destino, mas antes não apenas uma mais valia que herdámos como também a melhor janela de oportunidade para viver melhor, connosco e com o mundo. Não é uma proposta para santos, pois as misérias humanas foram testemunhadas por portugueses provavelmente mais do que por qualquer outro povo no mundo. É um trabalho de tecedura para o qual poderemos levar a estranha e ambígua bandeira dos Direitos Humanos, sinal em vias de ser renegado pelo Ocidente, que o usou também contra os interesses estratégicos de Portugal (e Brasil) durante o século XIX, aquando da substituição da escravatura pelo salariato.
Direitos Humanos em Angola, Guiné. Moçambique, S.Tomé e Príncipe, Timor e no Brasil podem bem ser marcas da presença portuguesa não contra mas a favor dos povos, intransigentemente contra os gestores de gestores que se tornaram a classe política dominante. Com tais países será possível refazer como melhor se entender a nossa demografia, fraternalmente. E acompanhar (com a mesma fraternidade) a emergência dos países emergentes, proporcionando-lhes a possibilidade de apoiarem uma experiência política democrática adaptada aos tempos – construindo um jogo de soma positiva para Portugal que os “mercados” estão prontos a negar, como se tem visto.
Uma tal perspectiva não é compatível com a política da mentira ou sequer da política “para inglês ver” que foi a sua predecessora. Precisamos de políticas de convicção, testadas democraticamente e apoiadas em princípios de igualitarismo, de serviço público (na administração, no terceiro sector e no sector privado) e no liberalismo judicial. Essas, sim, farão a diferença, porque serão mobilizadoras dos portugueses e dos seus amigos para novos horizontes de convivialidade mais próximos dos ideias humanitários do que a derrocada da civilização ocidental no Ocidente e a sua réplica exploradora na China e nos países emergentes faz antever.
Sociólogo > Professor Universitário
Olá Antônio! Sou estudante de Física e depois do anuncio de que o Brasil iria comprar um trem a grande velocidade comecei a pesquisar a respeito, a final o custo desse supérfluo equivale a 6 anos de investimentos no país inteiro por parte do Estado, descobri que na UFRJ no Rio de Janeiro tem um projeto nacional de trem por levitação magnética para uso nas cidades e terá uma linha que irá ligar os aeroportos Santos Dumont e Galeão e que poderia ser projetado um trem para maiores distâncias em parceria com a Alemanha, estou falando da tecnologia que substituirá todos os trens a grande velocidade, mas o Governo brasileiro excluiu essa proposta para comprar a tecnologia que em 10 anos não existirá nos países do 1º mundo, antes que me esqueça com o trem por levitação magnética o custo cairia pela metade e o tempo para a conclusão da obra também, somado a isso, a compra de submarinos nucleares,caças Rafale - que perdeu 6 concorrências de outros países-, porta-aviões, navios, helicópteros franceses.
ResponderEliminarEsse enorme gasto feito pelo governo lembra muito aquelas teorias de conspiração, pois se é identificado uma grande riqueza -o petróleo do pré-sal por exemplo- as grandes corporação vão até lá e induzem esses Estados a se endividarem para que esta riquezas na verdade vá parar no bolso deles - como Portugal e Inglaterra nos tempos da coroa, vendiam vinho do Porto e compravam todo o resto da Inglaterra- bom, eu rezo muito por duas coisas:
1º Nunca uma tropa de paz da ONU desembarque aqui no Brasil;
2ºQue estas teorias da conspiração e nova ordem mundial sejam falsas.
Por favor, perdoe alguns erros de português.
ResponderEliminar*anúncio, *...as grandes corporações vão...
Entre outros, esses deixaram-me envergonhado.
O seu texto revela que ainda há portugueses que reflectem o mundo actual. Reflectem-no com seriedade, isso é bom.
ResponderEliminarNão acha que esta pseudo-democracia mais não é que um verdadeiro capitalismo de estado? Sou levado a esta pergunta pois vejo que em Portugal só florescem as empresas do regime, que sem o apoio do estado não há empresa que resista, que os cidadãos estão anestesiados por uma comunicação social incapaz de reflectir sobre o mundo actual (ou quando o faz fá-lo a desoras), que o país mais parece um grande campo de claks de futebol...O futebol que até levado à comissão de ética da AR serviu para dizer: eu sou um ganhador, não se metam comigo pois ao fazê-lo metem-se com o Deus Futebol!
Caro Jatavares,
ResponderEliminarObrigado pelo comentário.
O capitalismo sempre se desenvolveu à sombra do Estado. O Estado soviético - e os outros que lhe seguiram o modelo - é que pensaram em dispensar a liberdade dos empresários e burocratizaram radicalmente o empreendorismo, a partir das administrações. No ocidente a burocratização deu-se apenas através das contabilidades cada vez mais complexas, até à gestão actual.
O mercado nunca foi livre: foi sempre guardado por canhoteiras. No caso português, como as canhoteiras são norte-americanas, ao serviço das potencias europeias, o modo de segurar alguma soberania foi nacionalizar (mas por via das sociedades secretas e dos empresários e comunicação social do regime) alguns sectores estratégicos.
APD
Caro Pedro
ResponderEliminar(Dispenso o Professor, se mo permite)
Obrigado pela sua resposta a qual me suscita uma outra problemática: até que ponto uma sociedade formalmente democrática, como a nossa, pode tolerar, acarinhar mesmo, as sociedades secretas. Tenho a ideia de que sociedades como a maçonaria atravessam os quatro cantos da terra mas li, algures, que nos USA , de vez em quando, o FBI dá-lhes caça. Cá, que eu saiba, nem com Salazar foram molestados e o resultado parece-me ser que cada vez estão mais arrogantes e dominam todo o aparelho do Estado.
Em Portugal, a degradação e a corrupção a que chegou o sistema político desta III República, o seu bloqueamento e a manifesta incapacidade de se auto reformar, leva qualquer cidadão a admitir, a desejar, uma profunda mudança não necessariamente do regime constitucional em que vivemos mas do “sistema” político corrupto institucional erguido pela nossa classe política ao longo dos últimos anos.
ResponderEliminarOs partidos transformaram-se em máquinas eleitorais, em partidos de notáveis, de uma nova aristocracia sufragada pelas televisões e sondagens. Neles preside uma lógica aparelhística, oligárquica de perpetuação política da elite que dirige o partido e o representa no Parlamento. Os partidos esvaziaram-se ideologicamente e assim deixaram de representar os interesses dos cidadãos para passarem a representar somente os interesses das suas clientelas partidárias. A profissionalização dos políticos, a mediocridade no seu recrutamento, a corrupção e o tráfico de influências são a realidade dos dias de hoje. Temos um Estado de partidos, redutor e totalitário quanto à representação dos interesses plurais da sociedade. Temos uma Democracia usurpada por estas elites, com responsabilidades de tomar decisões em nome do Povo, e que o atraiçoam logo que alcançam o poder ao romperem com todas as promessas eleitorais sem que daí advenha a revogação dos seus mandatos.
O falhanço do neoliberalismo económico, do capitalismo selvagem, do mercado sem regras e sem controlo, do mercado que se rege por si próprio, do menos Estado, do cidadão considerado não como um ser multifacetado, de múltiplas necessidades, éticas, culturais, sociais, mas tão só como simples consumidor. Princípios onde conceitos como a solidariedade, fraternidade, abnegação, tolerância, benevolência, são considerados nefastos, caducos, perturbadores e prejudiciais ao funcionamento normal da sociedade, o mesmo é dizer ao funcionamento normal do mercado. Para os neoliberais, o Homem é apenas corpo, não é alma, é consumidor e isso basta.
Surpresos com a crise económica, com a crise do neoliberalismo que irrompeu no mundo, sem compreenderem os seus fundamentos, os líderes europeus, a elite oligárquica europeia e americana, ensaiam múltiplas iniciativas económicas na esperança de que alguma resulte, na esperança de que tudo retome ao “normal funcionamento” anterior. Naturalmente que todas estas iniciativas podem atrasar momentaneamente o “natural” percurso da economia mas, no fundo, o que se deseja, é manter a mesma lógica económica, o que se pretende é a perpetuação das politicas neoliberais. E, como resultado, a mais curto ou médio prazo, um contínuo decréscimo do crescimento económico e um agravamento das desigualdades sociais com nova e mais profunda crise.
Só uma nova doutrina, uma nova filosofia, poderá inverter o rumo deste desenvolvimento capitalista neoliberal. Uma nova ideologia – a Democracia Social – que encerre em si, que incorpore, o princípio da unidade dialéctica entre o ser individual e o ser social, tendo como expressão a democracia política, com a vontade política dos cidadãos expressa em eleições democráticas e que assegure uma empenhada, permanente e continuada participação do cidadão na vida pública. Em que o acto eleitoral seja o corolário de uma participação activa, diária, continuada, do cidadão na gestão política da sociedade. Os eleitos são cidadãos temporariamente representantes, delegados das populações e a cada momento intérpretes das suas vontades. Uma nova forma de organização social que assegure o controlo social permanente sobre o Estado e as empresas. Uma nova forma de organização social, tendo como um dos seus objectivos a valorização da democracia participativa.
A Democracia não é apenas uma forma de governo, uma modalidade de Estado, um regime político, uma forma de vida. É um direito da Humanidade (dos povos e dos cidadãos). Democracia e participação se exigem. Não há democracia sem participação, sem povo.