terça-feira, 1 de junho de 2010

JP - o fim!

Encontramo-nos noutro lado

Extinto o "Semanário Privado", que deu origem a este espaço, goradas as intenções de poder dar à luz uma outra publicação com os mesmos propósitos, não se justifica minimamente a manutenção deste blogue.

Agora estou em
www.combatesocial.blogspot.com - para continuar por outros meios e travar os combates que me parecem necessários.

Um Abraço!

António Alte Pinho

terça-feira, 18 de maio de 2010

Blogada

É tempo de matar o porco!

por António Pedro Dores

A sentença ilibatória do senhor Névoa, a par da sentença condenatória do senhor Ricardo Sá Fernandes, chocou o País. Só um estado adiantado de decomposição das instituições e da moral pública permite tal conjugação nefasta de factos. Só não ocorre alarme público por radical desesperança popular na autoridade do Estado.

De pouco adiantou, uma década atrás, o reconhecimento oficial, por Jorge Sampaio, da crise do sistema judicial, do empecilho que ele constitui (cada vez mais) para o desenvolvimento e a democracia no País e da necessidade de reverter urgentemente a situação. Chegados a tais extremos, porém, com tal funcionamento das instituições – sejam elas o Parlamento responsável pela legislação em vigor, ou os sucessivos tribunais que apreciaram este (e outros) caso (equivalentes mas menos mediáticos) – fica claro que a corrupção, para além de ser uma forma de (des)organização política do Estado e dos mercados, é uma prática não apenas tolerada mas também protegida.

A circunstância da crise financeira e económica europeia, dentro da crise global do domínio ocidental no mundo, em particular a necessidade de concretização do famoso PEC, de nenhum modo excluiu ou sequer secundariza o desígnio nacional de organizar a luta contra a corrupção. Pelo contrário: é também contra a corrupção estrutural que se dirigem as invectivas dos que contestaram a ajuda à Grécia sem garantias, sem condições e sem fazer sofrer com a demora da ajuda. O que, ainda que doutro modo, poderá bem ocorrer também com o nosso país, nos mesmos ou em outros termos.

Os custos financeiros da corrupção, pudessem ser avaliados, ainda que de forma controversa, caso fossem evitados, não deixariam de ser uma forte (decisiva?) ajuda às contas públicas. Porém, é ao nível económico, ao nível das práticas de mercado, da confiança entre agentes de desenvolvimento e entre o Estado e a sociedade civil, nas suas diversas matizes, é a esse nível que o impacto do combate à corrupção mais efeitos terá. Não será possível reorganizar o País com vista a uma nova fase de desenvolvimento que urge realizar com a promoção por parte do Estado da corrupção alargada, contra os actos de coragem cidadã de pessoas com provas dadas de disponibilidade para o serviço público, como é o caso do denunciante acima citado, transformado em “agente encoberto” como forma de o estigmatizar por ter organizado a denúncia do que todos sabemos serem práticas correntes e lesivas não apenas das contas da Câmara Municipal de Lisboa, mas do Estado, da economia e da moral do país.

A política, bem como as decisões judiciais, não podem continuar reféns de argumentações técnico-administrativas para protecção de interesses criminosos que sugam as nossas riquezas. O combate à corrupção tem de ser uma prioridade de primeira linha. Não pode continuar a acontecer que as maiores acusações – entre as diversas autoridades jurídicas entre si, inclusivamente, entre polícias e magistrados do MP, entre políticos contra “a corrupção organizada ao mais alto nível do Estado” – não tenham efeitos práticos de tocar a reunir o partido contra a corrupção. É literalmente criminoso não reclamar por políticas efectivas e urgentes de luta nacional contra a corrupção, o que significa recolha de informação disponibilizada por quem possa aderir politicamente a tal desígnio para tratamento e alimentação das reacções – penais, administrativas, organizativas económicas, financeiras e outras – que se venham a conseguir coordenar com o mesmo fim.

Foto: DR

sábado, 15 de maio de 2010

Terceiro Estado

Bruna Real no país casto e puritano
que é Portugal


Por Cláudio Carvalho*

Sob o risco de me acusarem de uma crescente crítica social ao povo português, torno-o a fazer pela impossibilidade que é conter mais um ultraje aos princípios fundamentais republicanos por um conservadorismo pertensiosamente puritano.

Diz a Constituição da República Portuguesa, aprovada pela Assembleia Constituinte de Abril de 1976, que recomendo vivamente uma leitura, pelo menos na diagonal, a Maria Gentil Vaz, Vereadora do PSD com o Pelouro da Educação na Câmara Municipal de Mirandela e a José Pires Garcia, o director do Agrupamento de Escolas da Torre de Dona Chama, que "Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária". É o artigo primeiro, não deveria ser difícil, pelo menos, ter em conta o simples trinómio republicano "Liberdade, Justiça e Solidariedade". Já o artigo 42.º fala-nos da "Liberdade de criação cultural", que consagra o direito de Bruna Real em se expor numa reputada revista erótica, que não tive a felicidade de comprar mas que, pelos vistos, esgotou no mesmo concelho que a quer privar de dar aulas. Dita-nos a lei fundamental da nossa República, que a liberdade, direitos e garantias só podem ser suspensos em casos previstos constitucionalmente. Ora, não sou jurista, mas tenho o mínimo de bom senso para interpretar leis fundamentais e perceber que a cidadã Bruna Real, fora da sua actividade profissional de docente do Ensino Básico, tem o direito de livremente fazer o que lhe der na real gana, como diz o povo, dentro dos trâmites constitucionais, onde se enquadra a Liberdade de criação cultural e não me parece que os seus direitos possam ser privados por uma qualquer emissão de estado de sítio ou de emergência (artigo 18º, 19º e afins), por muitas qualidades físicas e intelectuais que esta possa ter.

Bruna Real tem 3 azares: é uma jovem bonita, por ser professora podemos considerá-la relativamente inteligente, acima da mediania certamente, e vive num país medíocre, onde o conservadorismo pseudo-moralista ainda é reinante, bem ao estilo do julgamento público de uma Maria Madalena portuguesa do século XXI, onde todos "atiram a sua pedra" sem qualquer motivação plausível. Maria Gentil Vaz e José Pires Garcia devem retratar-se quanto antes e devemos todos, sem excepção, encetar uma profunda reflexão quanto aos limites de intromissão do Estado, demais órgãos e de terceiros na esfera das liberdades individuais de cada um de nós. Meus caros, há muito Abril para efectivar, o caminho é longo e sinuoso...

*Editado no blogue Terceiro Estado
http://terceiroestado.blogs.sapo.pt/

Fascistas dos "costumes"

Um Salazar na cabeça...

O despedimento de uma professora de Mirandela, Bruna Real, por ter posado nua para a Playboy, suscita preocupações sobre o estado da Democracia portuguesa.
A professora, diga-se claramente, não praticou nenhum crime! Limitou-se a exercer o seu elementar direito à Liberdade.

A revista Playboy é uma publicação legal e não tem conteúdos pornográficos, sendo que só a lê quem quer. O que, pelos vistos, é o caso do presidente Silvano e da vereadora da Educação, Cultura e Turismo, D. Maria - que justificou o despedimento com "o alarme social"* que suscitou a publicação de fotografias da docente...

É bom de ver que o "Botas" continua, incólume no espírito de alguns portugueses!

________________________
*Definição de alarme:
1. Sobressalto e gritaria das pessoas que se reúnem e que convocam outras a juntar-se-lhes, para entre todas rechaçarem um perigo.
2. Rebate, sinal para avisar de perigo.
3. Boato assustador.
4. Grito para chamar às armas.

http://www.tvi24.iol.pt/sociedade/camara-mirandela-suspencao-professora-playboy-tvi24/1162846-4071.html

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Lugar à Esquerda

União Europeia?

por Mário Leston Bandeira*

Tendo passado 24 anos sobre a entrada de Portugal na CEE, em situação normal já seria tempo de se analisar criticamente os resultados dessa adesão e de se fazer um balanço político dos seus custos e benefícios.

Mas não estamos numa situação normal, porque Portugal e a maior parte dos seus parceiros da União Europeia estão a afundar-se numa situação cada vez mais grave. Comecemos então a fazer o balanço. Já chega de blá-blá europeu.

Na época da entrada na CEE, a intelligentzia portuguesa europeísta e a maioria da população aderiu, nalguns casos entusiasticamente, à ideia. Mas entre os entusiastas os motivos variavam.

Havia os que honestamente pensavam, e estavam no seu pleno direito, que Portugal beneficiaria com a sua integração num espaço economicamente próspero.

Mas os mais entusiastas seriam talvez os que esperavam ter oportunidades para fazer bons negócios e ganhar muito dinheiro, ou então para conseguir belos empregos na burocracia de Bruxelas.

Em alguns sectores, porventura mais lúcidos, alimentava-se talvez cinicamente a esperança de que, dada a indigência da vida política portuguesa e dos seus principais protagonistas e também o atraso cultural e o conservadorismo de grande parte da população portuguesa, a CEE “obrigaria” Portugal a modernizar-se e a atingir os padrões de vida e de desenvolvimento a que tinham chegado os nossos novos parceiros.

Dito de outra maneira: no entender dessas pessoas, provavelmente intelectuais cinicamente cépticos em relação ao futuro da mãe Pátria, era bom que viesse “alguém” de fora que fizesse por Portugal aquilo que os políticos, os patrões, os empresários e os banqueiros indígenas não conseguiam fazer. No fundo deles próprios, acreditavam nas virtualidades da estratégia da cenoura e do chicote, ou seja, a cenoura dos fundos estruturais e o chicote das leis, das regras e das ordens decididas em Bruxelas.

Com o passar do tempo, mesmo os nossos eurocépticos – o PCP e o PP do Manuel Monteiro – foram amolecendo, aderindo circunspectamente a um consenso nacional europeísta, o qual se reforçou com a entrada de Portugal no euro em 2002. O orgulho nacional de pertencer à UE já tinha, aliás, começado a subir em flecha com a aprovação em 2000 da Estratégia de Lisboa e atingiu o rubro com a recente assinatura do Tratado constitucional de Lisboa.

Pelo meio deste passar do tempo, até o primeiro-ministro Durão Barroso se deixou seduzir pela sereia de Bruxelas (não a de Copenhaga) e lá partiu ele para um belo emprego, deixando o país entregue ao Santana Lopes. Um golpe de génio.

Tem muitas histórias a história destes 24 anos de CEE/UE, como por exemplo as dos famosos fundos estruturais que, para além de terem contribuído para a construção de muitas auto-estradas, muitas delas desnecessárias, deram para muitas outras coisas, como por exemplo, arrasar com a agricultura, com as pescas, com as vias férreas e encher os bolsos de muito “boa” gente. Não vale a pena pormenorizar mais.

O texto já vai longo e o mais importante ainda não foi dito.

Em Março de 2000, o Conselho Europeu aprovou a chamada Estratégia de Lisboa que definia como principais objectivos da UE até 2010: promover o emprego e a coesão social através duma economia baseada no conhecimento.

Chegámos a 2010 e qual pode ser o balanço português destes nobres objectivos? A resposta é óbvia: desemprego, recessão económica, aumento das desigualdades e das discriminações sociais, aumento dos impostos, mais pobreza, mais corrupção.

E, como se não bastassem todas estas desgraças, confirmou-se politicamente durante o último fim-de-semana um facto que já era evidente desde há alguns anos: a supremacia dos países do Norte da Europa com a Alemanha à cabeça.

As ordens vêm do Norte e isso explica que o Primeiro-Ministro português tenha ido a Bruxelas no passado fim-de-semana receber guia de marcha: mais cortes, mais impostos, mais sacrifícios para os sacrificados do costume. Já estava tudo cozinhado em Bruxelas, o Governo português e o seu ministro das Finanças não precisaram de se chatear, não precisaram de fazer contas, o que, aliás, estaria para além das suas capacidades. Basta conferir os ziguezagues das previsões acerca do deficit que esses senhores foram papagueando desde o Verão passado, para se perceber que eles não conseguiram aprender a tabuada.

Há no meio de tudo o que tem vindo a acontecer um facto novo que me parece indesmentível: a chamada União Europeia já não existe. No lugar dela, temos agora, pelo menos três: a primeira, a que manda, que é a do Norte e outras duas, as que obedecem, que são do Sul e do Leste.

Esta nova tipologia ajuda-nos, aliás, a perceber que, sendo o Norte que comanda, é natural que a Irlanda, o Reino Unido e a Bélgica, cujas finanças também andam pelas ruas da amargura, sejam os países poupados pelo directório. Solidariedades puramente geográficas está-se mesmo a ver, nada disto tem nada a ver com racismo.

Quanto aos países do Sul, o dito directório chama-lhes PIGS (Portugal, Italy, Greece, Spain) e considera que são países incapazes de se governarem. Terão, não terão razão? Se calhar, já não temos a Europa connosco. Em que é que ficamos? À espera de Godot?

Se calhar o que é preciso é acordar.

Acordemos, não fiquemos em casa a ver televisão, não falemos só de futebol ou do vestido da vizinha ou do da colega de trabalho, não deixemos a política para os políticos e para os jornalistas, discutamos com quem aparecer, sejamos solidários, intervenientes. Sejamos capazes de lutar por causas, pondo em causa esta sociedade resignada, acomodada, em que às vezes parece que mesmo a desgraça do vizinho pouco importa.

Porquê acordar?

Quem nos garante que as desgraças alheias não vêm também bater à nossa porta?

* Professor Catedrático, Coordenador da Comissão Directiva da Nova Esquerda

quinta-feira, 13 de maio de 2010

PCTP/MRPP contra o PEC

As novas medidas celeradas de Sócrates
– este Governo e o Bloco central que o ampara
devem ser derrubados

Tal como se esperava, por ser próprio de um governo de sacripantas e vende-pátrias, o Governo do PS resolveu intensificar e alargar as suas medidas contidas no PEC inicial, todas elas para fazer a classe operária e os trabalhadores pagarem as consequências de uma crise para a qual em nada contribuíram e com a qual nada têm a ver.

Perdendo de vez a vergonha e contando com o apoio mais explícito do PSD, que aliás nunca lhe faltou, Sócrates, encenando a farsa de distribuir os custos do endividamento externo por todos, anuncia agora desesperadamente medidas que antes repudiara e que certamente não ficarão por aqui, e que atingem exclusiva e gravemente os que vivem do seu trabalho, os desempregados e os pobres.

Não está aqui em causa discutir se os impostos devem subir mais ou menos ou se corta nos subsídios de desemprego e noutras prestações sociais em lugar de roubar a parte do salário relativa ao 13º mês.

O que está em causa é toda a política que subjaz às medidas do PEC e ao que agora eufemísticamente se chama de medidas adicionais.

É que, em lugar de definir um plano de desenvolvimento económico para o país, única via geradora de emprego, este Governo, apenas se preocupa em adoptar medidas financeiras e orçamentais assentes num ataque desmedido e sem precedentes aos trabalhadores, para à custa destes satisfazer os abutres especuladores financeiros internacionais e os interesses das grandes potências industriais europeias, com a Alemanha à cabeça.

A situação é grave, não para os capitalistas a quem este plano e estas medidas visam salvar, mas para o povo trabalhador que, a deixar passar esta política, será atirado para condições de sofrimento, de miséria e de exploração inauditas, sem que possa alimentar sequer a mínima expectativa de se libertar delas, enquanto à frente dos destinos do país estiver um governo de bloco central, com o apoio e empenhamento de Cavaco Silva.

Aos trabalhadores portugueses resta lutar e lutar arduamente, colocando como objectivo político dessa luta, em solidariedade com a luta dos restantes povos da Europa, o do derrubamento deste Governo e a derrota desta política.

E para alcançar esse objectivo, é indispensável construir uma forte e ampla unidade da classe operária, dos trabalhadores, dos desempregados, dos democratas em torno da organização e realização vitoriosa de uma Greve Geral Nacional.

O PCTP/MRPP tudo fará para não deixar passar sem a resposta adequada esta declaração de guerra, denunciando os oportunistas e os cobardes que, aparentando divergir do governo, se tornam seus prestimosos cúmplices.

Lisboa, 13 de Maio de 2010

O Gabinete de Imprensa do PCTP/MRPP

http://www.pctpmrpp.org/

Ponta & Mola

Portugal dos pequeninos

por António Alte Pinho

O lixo sistémico navega nas águas sujas do parlamentarismo “bem comportado”. Soube agora que o PS, coadjuvado pela esquerda bloquista e comunista, se opôs a que o Parlamento se pronunciasse sobre o roubo de gravadores de jornalistas por parte do deputado Ricardo Rodrigues, alegando tratar-se de “comportamento pessoal e não político”…

Quer dizer, Ricardo Rodrigues dá uma entrevista enquanto deputado – e na Biblioteca da Assembleia da República –, nessa entrevista pratica um acto previsto e punível no Código Penal como roubo, mas os seus pares da esquerda patusca e alegre não encontram no facto nada de político (!?), relevando a questão: para que serve a “Comissão de Ética”?

Pelo andar da carruagem, poder-se-ia (em tese) admitir a possibilidade de os deputados, desde logo, poderem: 1. Roubar carteiras; 2. Praticar violações; 3. Promover homicídios… que isso – segundo o entender do PS, BE e PCP - seriam comportamentos de natureza pessoal, de momento que [presumivelmente] tais crimes fossem praticados na Biblioteca da Assembleia da República…

Sobre o “comportamento pessoal” de Ricardo Rodrigues, fiel servidor socratino, poder-se-á avivar a memória aqui: http://jornalprivado.blogspot.com/2009/11/o-ps-e-corrupcao.html
. Quanto a bloquistas e comunistas, que cada um fique na paz da sua consciência…

Foto: DR

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Nova Esquerda

Algo começa a mexer na política nacional. No apodrecimento do regime, nos cacos do parlamentarismo meramente retórico e no pântano da governação autoritária dos interesses e dos negócios, começam a germinar novas ideias e novos projectos de acção política, rompendo com o centrão dos interesses, afirmando uma nova esperança na capacidade criativa dos cidadãos e na energia larvar da sociedade.
O documento que reproduzimos dá vez e voz a uma Nova Esquerda de combate e de princípios, contra a velha esquerda gorda e acomodada aos pequenos poderes (e prazeres) da política.


BASES POLÍTICAS E PLANO DE ACÇÃO
DECLARAÇÃO DE ALMEIRIM

O sentimento dominante actualmente entre os portugueses é que Portugal é um país à deriva, sem rumo, que está á beira da bancarrota, não apenas financeira mas também social e política, como comprovam o contínuo aumento da pobreza, das desigualdades sociais e da desesperança.

A Nova Esquerda identifica as causas, os responsáveis e as consequências de uma tal situação do seguinte modo:

1. O Estado foi capturado pelos interesses das oligarquias dominantes com o consentimento de Governos conduzidos por políticos medíocres, incompetentes, sem convicções e que faltam à verdade.

2. A corrupção aumentou ao longo das últimas três décadas em paralelo com o monopólio do poder exercido pelas Direcções do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata, monopólio esse que tem promovido e protegido redes de interesses que se alimentam da promiscuidade entre as funções do Estado, a política e os negócios privados.

3. A economia tem sido asfixiada pelo poder arrogante dos bancos, pela especulação bolsista, pela prevalência dos interesses de grandes empresas cujos interesses estão representados nos gabinetes do Estado, pela desenfreada exploração e as discriminações de muitos trabalhadores e trabalhadoras, os baixos salários, os congelamentos de salários, os aumentos de impostos, o desrespeito pelo Estado de Direito.

4. As relações laborais, o mercado do trabalho e do emprego passaram a reger-se pela lei da precariedade e os jovens, tal como aconteceu na fase final do Estado Novo, porque não têm hoje futuro dentro das fronteiras acanhadas, medíocres e madrastas de Portugal, são empurrados para emigração.

5. Portugal é hoje, no plano internacional, um país refém das agências de rating, da especulação financeira internacional e do directório dos países que mandam na Comunidade Europeia, com a Alemanha à cabeça.

6. As pessoas estão descontentes, protestam entre si, insultam, dizem mal, mas ficam em casa, sentadas no sofá a olharem, cada vez mais cansadas e indignadas, as quotidianas novelas de mais um escândalo, encenadas nos telejornais.

7. Apesar de a sociedade estar a ferver em surdina, a ideia de democracia está em perda e fala-se de golpes, de pronunciamentos militares e crescem embrionárias ideias populistas.

8. Em resultado da acção dos Governos do PS e do PSD, o socialismo e a social-democracia tornaram-se em Portugal sinónimo de políticas neo-liberais, anti-sociais e de direita.

9. Existe um descrédito generalizado dos partidos, o que é comprovado em particular pelas elevadas percentagens de eleitores que deixaram de votar ou que votam branco ou nulo e também pela constatação de que, nas últimas eleições autárquicas, se apresentaram dez mil listas de candidaturas independentes.

Face a esta situação, preocupante e dramática pelas suas repercussões sociais e pelas ameaças que coloca ao futuro do país, os militantes da Nova Esquerda entendem que é necessário e urgente apostar em novos caminhos, novas soluções, novas políticas, novas ideias, e projectos que constituam alternativas à governação de direita que tem dominado o país há mais de trinta anos. Novas ideias que mobilizem e motivem as pessoas para a cidadania e a intervenção cívica e política, que restituam a dignidade à acção política, a favor da justiça e da solidariedade, na defesa dos legítimos direitos sociais principalmente das pessoas e das famílias mais vulneráveis, na condenação da corrupção e dos corruptos, dos oligarcas e dos políticos incompetentes, na defesa do Estado de Direito e da Democracia.

Reunidos em Assembleia no dia 17 de Abril de 2010 em Almeirim, os Militantes da Nova Esquerda - Movimento por uma Nova Sociedade aprovaram as seguintes Bases Políticas e Programa de Acção:

I
Uma Nova Esquerda para uma Nova Sociedade

Para dignificar a democracia e restituir a esperança aos portugueses, entendemos que é preciso lançar os fundamentos de uma nova sociedade.

Uma nova sociedade solidária, submetida aos valores supremos da justiça e da liberdade, que saiba valorizar os méritos de todos quantos contribuem para o progresso social e que seja capaz de prevenir, e em última instância punir, crimes graves, uma sociedade criativa na cultura, na educação, nas artes e na economia, uma sociedade ecológica que saiba preservar e valorizar os seus recursos e a diversidade da natureza, que combata o desperdício e promova o consumo inteligente e adequado ao desenvolvimento justo e equilibrado dos cidadãos num quadro de sustentabilidade económica e ecológica, uma sociedade que valorize a felicidade individual, uma sociedade que invista no conhecimento e na ciência.

Uma nova sociedade baseada na cidadania universal, igualitária e sem discriminações, que assegure a igualdade de oportunidades, a igualdade perante a lei e a justiça, o direito ao emprego e a salários dignos, que não tolere o stress, o assédio, a discriminação e os abusos de poder no trabalho e, de um modo geral, se bata pela realização dos Direitos Humanos.

Uma nova sociedade que reconheça de forma concreta o direito de cada cidadão a ter uma família, a procriar, a ter filhos e a poder educá-los para a cidadania e a plena realização pessoal.
Para que ela exista, esta nova sociedade precisa que se reabilite e se dignifique a política, dando protagonismo à voz dos cidadãos e das organizações de intervenção cívica e moralizando a prática política no interior dos partidos. Precisa que se democratize a participação cidadã dentro e fora dos partidos, que se reforme o Estado e o sistema político-partidário. Exige que os partidos cumpram as promessas que defendem nos actos eleitorais, que governem de acordo com os programas sufragados pelos eleitores, que governem ao serviço do bem público e do interesse geral.

É totalmente incompatível com essa nova sociedade que qualquer partido que se apresente como sendo de esquerda conduza a sua acção no Governo de acordo com a ortodoxia neo-liberal, monetarista e anti-social, a qual constitui a cartilha dos partidos de direita. Na situação actual são completamente condenáveis - e o total descrédito da velha esquerda socialista em Portugal comprova isso – as políticas praticadas pelos Governos do Partido Socialista, as quais conduziram o país a uma gravíssima crise que, para além de financeira, é social, moral e económica.

A obsessão pelo deficit que castigou principalmente os contribuintes assalariados, fez estagnar a economia e promoveu o desemprego, afastou os imigrantes e causou nova onda de emigração apenas comparável à dos anos 60. O código do trabalho aumentou a precariedade no emprego e retirou direitos aos trabalhadores para contentar os interesses míopes do patronato e dos grandes grupos financeiros e económicos. As poderosas teias da corrupção ficaram à rédea solta. O descrédito e a inoperância da justiça no combate à corrupção e aos desmandos dos mais poderosos tornou-se endémico. A grave crise do ensino público e a instabilidade nas escolas, a guerra aos professores e a outros importantes grupos profissionais, o aumento da idade da reforma e a diminuição das pensões, são episódios da interminável guerra social de que resultaram pelo menos dois milhões de pobres, milhares e milhares de desempregados, muitos sem direito a subsídio de desemprego, milhares de idosos, cujas pensões mínimas e miseráveis aumentaram abaixo da inflação e que agora estão praticamente congeladas, milhares de jovens que não conseguem um emprego estável e com direitos, milhares de trabalhadores despedidos sem justa causa ou porque os patrões resolveram fechar a empresa para, de seguida, abrirem noutro lugar um negócio mais lucrativo, manobras a favor da privatização de serviços públicos, complacência face às máfias da imigração e à exploração do trabalho clandestino por patrões sem escrúpulos. Eis apenas algumas das marcas indeléveis da herança que o Partido Socialista trouxe ao país que governa, sem interrupção, há mais de 5 anos.

Sendo tal herança a negação dos ideais, das referências e dos valores históricos que situavam o socialismo e a social-democracia à esquerda, resulta óbvio que quem tem dirigido o Partido Socialista levou este partido a romper com a esquerda, fazendo-o alinhar incontestavelmente entre as forças de direita.

Temos divergências, mas também temos algumas concordâncias programáticas e ideológicas com a esquerda representada em Portugal pelo Partido Comunista e pelo Bloco de Esquerda. Partilhamos com a maioria dos militantes destas organizações o ideal de justiça social e que as políticas do Estado devem influenciar uma distribuição mais equitativa da riqueza. Partilhamos ainda com eles a sua crítica do império do mercado e do primado dos valores privados sobre os interesses da comunidade.

Discordamos, contudo, da perspectiva dessas organizações de que as metas políticas e os ideais da esquerda possam ser alcançados através de um partido único, de um Estado centralizador e de uma economia estatizada.

Criticamos a sua não assimilação autocrítica das experiências recentes do falhanço do modelo politico e económico que defendem . Quer a antiga URSS e posteriormente a China evoluíram para sociedades autocráticas e ditatoriais, exploradoras das classes populares por uma oligarquia político-partidária que se separou da sociedade.

Defendemos que não é ao Estado que compete produzir bens, mas tal não o redime no seu papel em assegurar liberdade e justiça, educação, saúde e segurança para todos e solidariedade para com as pessoas e as famílias em dificuldade.

Porém, cumprir tal papel só será exequível se o Estado dispuser de meios de comunicação social próprios, de um banco central (Caixa Geral de Depósitos) vocacionado principalmente para financiar a economia social do terceiro sector e as pequenas e as médias empresas, se o Estado tiver o controlo de recursos essenciais e estratégicos como a água, a energia e as redes viárias. Entendemos também que é da estrita responsabilidade do Estado regular e supervisionar as actividades das entidades financeiras e do sector privado e combater de forma enérgica e eficaz as investidas do capitalismo neo-liberal.

O Serviço Público que defendemos deverá ser eficaz e estar sob o controlo permanente da sociedade civil a todos os níveis. Deve ser estruturado e dirigido por forma a que seja banido o clientelismo e o controlo pelas oligarquias partidárias. A gestão de cada organismo deverá ser da responsabilidade de gestores que sejam providos nas suas funções através de concursos públicos transparentes, com júris acima de qualquer suspeita capazes de julgar de maneira imparcial cada candidato tendo em conta a sua competência e qualificações e provas dadas em relação ao cumprimento das exigências e das finalidades do serviço público.

A qualidade de cada serviço deverá estar em permanência sujeita ao escrutínio público e à avaliação dos cidadãos e, quando desvirtuada a qualquer nível que seja, deverá ser de pronto criticada, investigada e corrigida.

O desenvolvimento económico deve ser social e ecológico, deve subordinar-se aos direitos sociais e à preservação dos recursos naturais.

Uma forte consciência social e uma nova consciência ecológica não podem tolerar a lógica do desperdício e os excessos do consumismo e as escandalosas desigualdades entre quem tudo tem e quem nada tem.

Condenamos e rejeitamos o aumento brutal das diferenças e das desigualdades salariais. Defendemos uma nova ordem fiscal.

O principal direito social é o direito ao trabalho, o mais básico e estruturante. O emprego com plenos direitos e o pleno emprego devem ser os principais objectivos económicos a alcançar por uma política de esquerda.

O novo modelo de desenvolvimento que defendemos deverá subordinar-se ao direito ao trabalho e ao pleno emprego, mas também ao direito ao lazer em todas as idades, e ao direito à formação e à cultura, à felicidade e à realização pessoais ao longo do ciclo de vida de cada um, na infância, na adolescência e na juventude, na idade adulta e na idade sénior.

Pleno emprego e trabalho para todos são exigências essenciais que implicam a partilha do trabalho e trabalhar menos horas.

O desenvolvimento económico terá que ser mais igualitário, mais justo, mais prudente, mais racional e mais preocupado com o futuro da Humanidade. A defesa desse futuro implica o fim do modelo económico capitalista.

O capitalismo na sua fase actual atingiu uma fronteira para além da qual só existe um abismo suicida que poderá arrastar a Humanidade para uma guerra global.

Por isso, tem que ser travada definitivamente a engrenagem que assenta na exploração, sem quaisquer limites éticos ou considerações sociais e ecológicas, dos recursos naturais e da força de trabalho. Uma engrenagem determinada cegamente pela ambição paranóica do crescimento ilimitado, dos lucros sem fim e do poder absoluto do dinheiro.

Para os capitalistas dominantes os pobres não existem, os trabalhadores são descartáveis. Ora, o direito de propriedade não é um direito de vida e de morte, é um direito com deveres para com a sociedade, incluindo deveres de solidariedade para quem trabalha e para quem precisa.

No novo modelo de desenvolvimento que defendemos, o terceiro sector livre das peias que hoje o desfiguram, com capacidade de iniciativa e inovação, deverá desempenhar uma função crucial.

Entre o sector público, que deve ser regulado pelas instituições democráticas e o sector privado, que deve ser regulado pelo mercado e pelas leis da República, o terceiro sector pode ocupar-se de uma multiplicidade de actividades úteis à sociedade e à coesão social, que não se enquadram nem nas lógicas estatais nem nas regras mercantis, assim estejam reunidas as condições estruturais propícias à autonomia do sector e das entidades socioeconómicas que o compõem.
A economia do terceiro sector é uma economia solidária, social, promove o emprego, a inserção profissional dos jovens, promove a integração socioeconómica dos excluídos e deve orientar-se para o bem-estar das famílias e para organizar a herança patrimonial, tanto ecológica como social e edificada, para perspectivar um futuro confortável para as novas gerações.

O terceiro sector tende para a autogestão, para a igualdade e para uma relação atenta e interessada com o ambiente. Nele podem integrar-se cooperativas de produção, cooperativas de distribuição associadas a produtores e a cooperativas de consumo, cooperativas de ensino, culturais e artísticas, associações sociais.
O terceiro sector promove também a auto-organização dos produtores em empresas sem fins lucrativos, quer sejam iniciativas de criação de auto-emprego ou empresas que sucedam a empresas privadas em processo de falência.

Nos casos de empresas em processo de falência, deve ser reconhecida legitimidade aos respectivos trabalhadores para convocarem a intervenção do Estado com vista à transferência dessas empresas para um regime de propriedade social, sendo simultaneamente avaliada a viabilidade económica do projecto que apresentam para salvaguardar os postos de trabalho, quer seja no sector de produção em que a empresa funcionava, quer seja em nova área.

Com vista à reconversão de empresas em falência ou à criação de novas empresas, a funcionarem em regime de economia solidária, os produtores interessados deverão apresentar propostas e estudos de viabilidade, sendo nessa tarefa apoiados por universidades ou por politécnicos, por serviços técnicos do Estado ou por associações devidamente acreditadas e apoiadas pelo Estado.

Os três sectores podem conviver e até cooperar, a bem do desenvolvimento e da prosperidade social e económica. O sector público e o terceiro sector estão naturalmente vocacionados para actividades de carácter colectivo e solidário. Na medida em que o usufruto da propriedade privada deve tender para assumir valor social, também o sector privado deve reger-se por finalidades solidárias e a actividade empresarial deve ser devidamente avaliada e recompensada, quando for caso disso, em função dos seus contributos e práticas sociais.

Queremos uma economia social de mercado.

Seremos uma esquerda pacifista, uma esquerda que, seguindo o exemplo de Jean Jaurès, defende a paz contra a guerra, uma esquerda contra a violência e contra o terrorismo e que, na esteira do Mahatma Ghandi, considera legítimo o direito à desobediência civil e à resistência pacífica contra os abusos do poder e as injustiças, e na luta por causas públicas relevantes.

Uma esquerda virada para o futuro, capaz de avaliar de maneira crítica o legado histórico das diferentes esquerdas, sem que isso implique reavivar velhas querelas. Virada para o futuro, mas mantendo e valorizando a continuidade dos valores políticos de esquerda e os seus contributos na luta pelo progresso da Humanidade.

Seremos um movimento que pretende ser uma plataforma, um lugar de acolhimento de todas as correntes de pensamento empenhadas na renovação do pensamento e da praxis de esquerda, do progresso social, da solidariedade e da democracia. Criaremos uma estrutura capaz de acolher todos os que se revejam na necessidade de se resgatar a esquerda e a democracia do neo-liberalismo e da corrupção, independentemente das suas ideias políticas mais específicas. Capaz de reinventar a esquerda pela nova sociedade com que sonhamos.

Uma esquerda que dará protagonismo às mulheres, aos jovens e aos seniores, tolerante, aberta à sociedade, um movimento construído a partir do que é local, que privilegiará a vida autárquica e os orçamentos participativos, que defenderá o associativismo autónomo, que conduzirá a sua acção de maneira atenta e à escuta da sociedade, em colaboração com grupos de cidadãos, associações cívicas, sindicatos e empresas do terceiro sector.

Para que a Nova Esquerda - Movimento por uma Nova Sociedade que pretendemos construir seja socialmente activa e assuma um lugar proeminente na comunidade política, impõe-se que ela se transforme em partido. Para a concretização desse objectivo, foi decidido organizar uma Convenção Nacional.

II
Convenção Nacional da Nova Esquerda
- Movimento por uma Nova Sociedade

A Assembleia aprovou as seguintes medidas relativas à organização de uma Convenção Nacional com vista à fundação do partido Nova Esquerda - Movimento por uma Nova Sociedade:

1. A I Convenção do Movimento realizar-se-á, se possível, até finais de Outubro de 2010, quando estiverem criadas as condições políticas e logísticas necessárias. A data e o local, a constituição da Comissão Organizadora, a ordem de trabalhos e o regulamento da Convenção serão da responsabilidade do órgão directivo da NE - MNS. Da ordem de trabalhos deverão constar obrigatoriamente a aprovação das Bases Programáticas e dos Estatutos.

2. Até à realização da Convenção, a NE - MNS incentivará a constituição de núcleos locais e temáticos aptos a aprofundar e a divulgar os objectivos da NE e a recolher adesões e assinaturas com vista à legalização futura do partido.

3. O órgão directivo deverá, em articulação com os núcleos, organizar debates com convidados, festas e sessões de esclarecimento junto de aderentes ou simpatizantes. Deverão ser constituídos grupos de trabalho dedicados à discussão do programa e dos estatutos do futuro partido. Será criada no site da NE – MNS uma página dedicada a estes debates e a contributos individuais ou de grupo.

4. A Assembleia propõe à reflexão dos militantes da NE, com vista à elaboração de propostas à Convenção e à dinamização do Movimento, os seguintes temas de reflexão:

● Economia solidária e ecológica, livre iniciativa, criação e distribuição de riqueza

● Pobreza, desigualdades e discriminações sociais

● Reforma do Estado, da Justiça e do sistema político-partidário, erradicação da corrupção

● Papel do Estado, investimento e serviços públicos

● Igualdade de oportunidades, escolas públicas e sistema de ensino

● Equidade territorial, humanização das cidades e desenvolvimento do interior

● Políticas do ciclo de vida, família, educação, formação, trabalho, saúde, reformas e

● Avaliação do que é hoje a Comunidade Europeia e qual a sua viabilidade, utilidade e futuro políticos

● Defesa de comunidades locais, nacionais e internacionais, promotoras da resolução dos diferendos pela negociação e pelas instâncias do Direito internacional, contra a guerra e as ditaduras

● Posição de Portugal e da Europa no contexto da globalização

● Análise e caracterização da forças politicas, ideológicas e partidárias em Portugal e politica de alianças da NE

● Como refundar a Esquerda e mudar as mentalidades e a praxis políticas

Almeirim, 17 Abril 2010

A Assembleia de Militantes da Nova Esquerda
– Movimento para uma Nova Sociedade
www.novaesquerda.org

terça-feira, 27 de abril de 2010

Património

Em plena Lisboa,
a cair aos bocados!*

por Pedro Quartin Graça

Em Campolide, paredes meias com a Universidade Nova, em pleno centro da capital, uma igreja cai aos bocados desde há anos perante a mais impune cumplicidade do Estado português...

Basta ir ao fundo da Rua de Campolide, lado descendente, para avistar uma igreja, aparentemente "composta", classificada pelo IPPAR em 1993 e ainda propriedade do Estado Português, mas que se encontra votada ao mais completo abandono. Vista mais de perto, os acessos à mesma são uma lástima e o aspecto do monumento um verdadeiro nojo.

No passado dia 7 de Março o Provedor de Justiça Alfredo José de Sousa defendeu que a Igreja de Santo António de Campolide, é este o seu nome, deve ser entregue ainda antes de se assinalar um século sobre o confisco dos bens eclesiásticos pela República, a 08 de outubro de 1910. E mais acrescentou: "Embora a Direcção Geral do Tesouro e das Finanças tenha reduzido o valor da proposta de venda de 260 000 euros para 233 000 euros, é difícil admitir que se pague por um imóvel confiscado que apresenta um estado de conservação incompatível com a segurança de pessoas e bens e com a classificação por interesse artístico". Ficamos à espera que o Estado, ao menos desta vez, demonstre ser uma pessoa de bem.

* Também publicado no Blog "Corta-Fitas"

Foto: DR

terça-feira, 13 de abril de 2010

«Lápis Azul» ataca na blogosfera?

Eles andam aí...

Durante a tarde de hoje, sensivelmente entre as 16h50 e as 18h50, este blogue - por razões que desconheço mas que posso imaginar - esteve indisponível.

Sempre que alguém procurava aceder ao link, aparecia o seguinte aviso:

«O blogue foi removido
Lamentamos, mas o blogue em jornalprivado.blogspot.com foi removido. Este endereço não é válido para blogues novos.»

Sem querer entrar em conjecturas conspirativas, direi apenas que o incidente é estranho e preocupante. E, tendo recorrido a amigos que dominam o meio melhor que eu, foi unânime a consideração em «não haver explicação plausível»...

Os «coronéis» da blogosfera, como os da censura fascista, andam por aí - ao que me dizem. E recomendam-me «cuidados»...

Fica o «aviso à navegação»!
António Manuel Pinho

Sahara Ocidental

Aminatu Haidar
pede ao governo de Espanha que siga o exemplo de Portugal

A activista saharaui Aminatu Haidar pediu este Sábado ao Governo de José Luis Rodríguez Zapatero que rectifique e exerça a sua responsabilidade "histórica, jurídica e moral" para com o povo saharaui, tal como fez Portugal com Timor-Leste.

Haidar fez uma intervenção durante a tarde de Sábado no recinto desportivo de La Almudena da Universidade Complutense de Madrid onde, desde o dia 15 de Março, se realiza um acampamento a favor de um Sahara livre sob o lema "35 anos de esquecimento. 35 dias de ruído", acção convocada por estudantes desse campus universitário e pela Coordenadora Estatal de Associações Solidárias com o Sahara.

Durante o colóquio, e após ter feito uma intervenção sobre a situação do Sahara Ocidental, Haidar afirmou considerar necessário exercer "pressão" sobre o Governo espanhol para que rectifique o erro que cometeu com os acordos de Madrid sobre o Sahara Ocidental e siga o exemplo de Portugal, que "se posicionou a favor de Timor-Leste".

No mesmo sentido se pronunciou a advogada de Aminatu Haidar, Inés Miranda, a qual afirmou que o Governo de José Luiz Zapatero "não está à altura da resposta que lhe é exigida pela sociedade civil".

Aminatu alertou para a "nova estratégia" Governo de Mohamed VI de "armar" os colonos marroquinos, o que, na sua opinião, pode dar lugar a confrontos sangrentos entre saharauis e marroquinos e, inclusive, a "massacres" como ocorreu em Timor-Leste antes da independência.



Despacho da agência noticiosa SPS
Divulgado pela Associação de Amizade Portugal-Sahara Ocidental


Foto: SPS

sábado, 10 de abril de 2010

Alerta!


Autorizaram a ocupação
de Portugal?
- Fonte: PHI (Politische Hintergrundinformationen)
de 26.2.2010, pág. 60 -

Existe um EXÉRCITO SECRETO EUROPEU, que também pode ser chamado de FORÇA SECRETA POLICIAL DE INTERVENÇÃO PARA O ESMAGAMENTO DE REVOLTAS NA EUROPA.

Já se encontra dentro da União Europeia, porém apenas muito poucos sabem disso.

A força possui os mais amplos direitos, tem de momento 3.000 homens e responde pelo nome de “EURO GENDFOR (EUROPEAN GENDARMERIE FORCE)”, ou seja, TROPA DE POLÍCIA EUROPEIA. O seu comando encontra-se em Vicenza, na Itália, longe do Centro da UE.

Quem deu vida a este projecto foi a Ministra da Defesa Francesa, Alliot-Marie, com o objectivo de mais facilmente esmagar levantamentos populares, como os que têm surgido frequentemente em cidades francesas.

Esta força, já existente, pode agora ser empregue por toda a União Europeia, anulando os direitos nacionais e as soberanias dos Estados Membros!

O Tratado de Velsen (Holanda), decidiu de forma inequívoca, que vai ser um CONSELHO DE GUERRA, que vai decidir sobre a sua actuação. Este conselho compõe-se dos Ministérios de Defesa e de Segurança dos países membros da UE, inclusivamente do país onde vai ser aplicado.

Aos olhos dos observadores trata-se de uma clara manifestação de um DIREITO DE OCUPAÇÃO DA EUROPA. Porque, desde que tenha sido decidido por unidades da EURO GENDFOR a ocupação de edifícios e regiões, ficam estas debaixo da sua alçada, já não podendo sequer ser visitadas pelos organismos oficiais do país a que territorialmente pertencem. De facto, existe assim um DIREITO DE OCUPAÇÃO EUROPEU. Porém, a situação pode vir a piorar ainda mais.

A EURO GENDFOR não possui apenas os direitos policiais, mas também a competência sobre os serviços secretos, e, pode, em estreita colaboração com forças militares, restabelecer a lei e a ordem nas zonas consideradas convenientes. Em caso de necessidade, deve esta tropa possuir todos os direitos e acessos a todos os meios considerados necessários, para executar o respectivo mandato.

Graças à EURO GENDFOR encontram-se os governos europeus à vontade. Desta forma podem ordenar o abrir fogo contra as próprias populações em caso de demonstrações de massas, colocar regiões inteiras sobre quarentena militar e prender os principais cabecilhas, sem ter de chamar militares, ou polícias, da sua própria nação, visto existir o perigo destes se solidarizarem com os revoltosos.

A EURO GENDFOR, por sua vez, graças às suas excepcionais atribuições de direitos civis e militares, não pode ser responsabilizada por ninguém.

Este cenário, que parece incrível, tornou-se agora possível através da entrada em vigor do TRATADO DE LISBOA, que não é mais do que a Constituição da UE sob novo título.



http://www.grifo.com.pt/

Novas Farpas

Cavaco Silva
- um velho do Restelo


Simões Ilharco

Costumo dizer que alguns dos nossos políticos são os piores da Europa. E Cavaco Silva, que Passos Coelho, no congresso do PSD, desafiou a recandidatar-se, é bem um exemplo vivo do que afirmo, ao ponto de o considerar um velho do Restelo. Explico porquê: quando surgem propostas, oriundas deste Governo, mais avançadas para o País – que é, aliás, o que Portugal precisa para se desenvolver e modernizar –, o actual PR opõe-se. Foi assim com as Uniões de Facto, o casamento gay, o TGV, o novo aeroporto de Lisboa, as novas auto-estradas, etc…


Por suprema ironia, Cavaco Silva, quando era primeiro-ministro, passava a vida a falar das forças do bloqueio e ele mesmo é, agora, o grande bloqueio ao progresso e à modernidade. Mas que contradição insanável professor Cavaco Silva! Como diz o adágio popular, pela boca morre o peixe…

A obsessão do Presidente da República pelos números, pelo endividamento, que era extensiva a Manuela Ferreira Leite, quando o PSD tem mais dívidas à banca do que todos os outros partidos juntos, já fez adiar duas linhas do TGV – felizmente que o trajecto Lisboa-Madrid mantém-se dentro dos prazos previstos – e remeteu para as calendas gregas o novo aeroporto de Lisboa.

Se fosse sempre esta lógica de raciocínio a imperar no nosso país, nunca se teria feito, por exemplo, a Expo’98 (ainda me lembro do fabuloso dueto de José Carreras com Teresa Salgueiro, a quem chamava madredeusa), o Euro’2004 (que magnífica realização!) e a Ponte Vasco da Gama (quem duvida da sua utilidade?).
O País necessita das grandes obras, sejam ou não faraónicas, como dizem (mal) os seus detractores, como carecia, do mesmo modo, de uma revolução nos costumes, bem urdida, aliás, pelo PS de Sócrates. Ignorar estas realidades – ou pior do que isso, contrariá-las – é revelar uma mentalidade conservadora e retrógrada imprópria do século em que vivemos.

Sabe uma coisa, professor Cavaco Silva? Portugal precisa de gente progressista. Não é o seu caso. Afastá-lo de Belém, deverá ser a grande prioridade política de todos os democratas portugueses.

Foto: PEDRO CARDOSO

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Código de Execução de Penas

Oportunismo populista
e (falta de) ética

O novo código de execução de penas está aprovado faz vários meses. Apenas agora, Abril de 2010, entra em vigor. Seria natural que apanhasse de surpresa as pessoas menos informadas. Mas os sindicatos do ministério público, dos polícias e o CDS/PP também foram apanhados de surpresa? Ou querem apenas fazer chicana política?


Portugal, infelizmente, não tem uma tradição forte na defesa dos direitos dos arguidos. Há quem pense e diga não haver em Portugal respeito pelo Estado de Direito. Há mesmo quem tenha declarado serem os tribunais onde mais se ofendem os direitos humanos dos cidadãos. Todos temos de concordar, por outro lado, ser a justiça – incluindo o desrespeito normalizado pelos direitos de quem esteja implicado em casos judiciais – um dos maiores e mais importantes obstáculos ao desenvolvimento do país.

Fazer chicana política com a justiça – neste caso com o código de execução de penas – é crime contra a necessidade de se dar a volta a este óbice ao nosso bem-estar, ao prestígio do nosso país e da nossa cultura. É intolerável vir para a comunicação gritar que 6 anos de prisão por um crime de sangue (um quarto da pena máxima) é pouco. Que é um desrespeito pelas vítimas.

É pouco para quê? É pouco para quem?

O sistema de penas de prisão proporcionais aos crimes cometidos, sob apreciação de um juiz independente, não resolve o problema da emergência de criminalidade nas sociedades. (De facto acontece aumentar o crime e diminuir o número de presos, como acontece actualmente em Portugal, como acontece diminuir o crime e aumentar o número de prisioneiros, como aconteceu durante os anos 90 em Portugal.) Mas foi o estado a que foi possível chegar, através de experiências milenares, para fazer justiça através do direito, segundo um modelo ocidental adoptado universalmente por todas as civilizações.

A justiça do Estado não substitui o sofrimento das sociedades no dirimir dos crimes a que estas estão sujeitas. A maioria dos crimes cometidos – sejam eles os das cifras negras da criminalidade, como a criminalidade não denunciada ou a criminalidade não condenada após tratamento institucional, sejam eles os crimes de colarinho branco, sobretudo os perpetrados pelos amigos e parceiros de negócios das classes dominantes – são sofridos, aguentados e curados pelas sociedades, à margem do Estado, quantas vezes sob pressão do Estado para evitar queixas e eventuais escândalos. Sofrem, como todos sabem bem, sobretudo mulheres e crianças. Na guerra ou nos abusos sexuais.

O novo código do processo penal é uma reacção do Estado a uma situação calamitosa vivida em Portugal nos anos 90, quando o número de óbitos e doentes entre os presos atingiu picos várias vezes superiores à média da União Europeia e mesmo bastante acima dos verificados na Rússia e outros países de Leste, conhecidos pela máxima dureza das suas práticas penitenciárias. Essa reacção tem um aspecto francamente positivo: obrigar ao uso das penas de prisão em regime aberto que durante décadas foram tal uso foi inibido por decisões negligentes das entidades responsáveis e que, na prática, resultaram na calamidade face à qual Freitas do Amaral disse um dia serem necessários 12 anos – ainda a decorrer – de esforços consistentes para que as prisões portuguesas, um dia, possam ser comparáveis com os standard europeus médios.

Há quem pretenda mobilizar o espírito de vingança dos portugueses para evitar expor ao que vêem quando reclamam por penas mais pesadas. Mas não é preciso grande perspicácia para entender o seu acanhamento.

O CDS/PP acha muito bem os prémios milionários aos gestores em tempos de crise, defende a contenção nas acusações públicas contra pessoas indiciadas judicialmente (sobretudo quando lhes são próximas) e joga nos bastidores as conspirações defensivas, conciliatórias ou de contra-ataque (a alta política dos dias de hoje), e entende tudo isto ser compatível com a redução dos rendimentos dos mais pobres, sabendo que mesmo quem trabalha aufere salários insuficientes para a sobrevivência, alinhando até com todas as políticas tendentes para reduzir ainda mais tais salários, em nome da saúde das empresas. O CDS/PP sabe, como todos nós sabemos, que as prisões são para os pobres e lá as doenças e a morte ceifam vidas em modo acelerado. Há pois alguma coerência nas posições de direita: engavetar a exclusão social; dividir entre os pobres bons e os pobres maus é uma velha receita.

O Ministério Público entrou em guerra contra a droga, nos idos de 80. Conseguiu transformar as prisões em centros de acolhimento forçado de toxicodependentes e, ao mesmo tempo, de supermercado oficioso de tráfico de drogas inflacionadas, de baixa qualidade, de alto risco para os consumidores e de alta rentabilidade para os traficantes. A linha de comando entre o ministério da Justiça e cada estabelecimento prisional, e mesmo dentro dos estabelecimentos prisionais, não existe, dada a concorrência entre si dos poderes fácticos locais e dos interesses que trocam entre si. A ponto de um destes dias centenas de homens da GNR, enviados para acalmar um juiz irritado, ao que parece, invadiram uma grande prisão no Norte para inspeccionar igualmente presos e funcionários com vista a surpreender os tráficos aí existentes. Vem agora o sindicato dizer à praça pública que quer manter activos os negócios prisionais? A sua tarefa deveria ser a de acabar com eles!

Compreende-se que o governo esteja concentrado no essencial para si, exaurido de capacidade de combate por causas “secundárias”, como essa de defender a justiça e o direito. Pela nossa parte estamos dispostos e disponíveis para defender a aplicação alargada de regimes abertos de prisão, com argumentos, com base na experiência portuguesa e nas responsabilidades de cada um na construção de um Portugal sem histerias e focado em melhorar a vida de todos. É assim que entendemos a Justiça.

Lisboa, 2010-04-09


António Pedro Dores
antonio.dores@iscte.pt
[Sociólogo, Professor Universitário - texto escrito em nome da Associação Contra a Exclusão pelo Desenvolvimento, ACED]

Foto: DR

sábado, 3 de abril de 2010

A Igreja Católica e a pedofilia

A pretexto do apagamento da memória que parece ter dominado algumas cabeças eclesiásticas, histórias de abuso e pedofilia continuam a ensombrar o passado da instituição, principalmente porque «a dor das crianças não mente»…
Remonta a Julho de 2004 a peça que, então, publiquei no semanário «O Crime». Apesar da denúncia à autoridade máxima do Seminário de Beja, ao que sabemos nenhuma diligência, até hoje, foi promovida pela hierarquia no sentido de apurar factos e acontecimentos.
A actualidade do artigo é inquestionável, e as denúncias com rosto ali postadas são à prova de fogo. Mas, apesar do formalismo de uma «culpa assumida», a Igreja continua a assobiar para o lado - alegando estar a ser «perseguida»...



Seminário de Beja fornecia «meninos» para orgias
O silêncio das sotainas

Durante anos o Seminário de Beja escondeu vícios privados e ostentou públicas virtudes. Senhores da região, muito beatos, estenderam a sua «caridade» à inocência e miséria de meninos pobres que ficaram marcados para toda a vida. O manto protector das sotainas ainda hoje é cúmplice de silêncios imemoriais. A religiosidade do povo alentejano, aos poucos e timidamente, procura resgatar Cristo da ignomínia de seus ardentes devotos…

Majestoso e imponente, o edifício do seminário de Beja ergue-se beijado pelo tórrido calor alentejano à quietude pardacenta do jardim público, onde velhos e crianças pela mão descansam e passeiam entre o arvoredo.

A cidade recebe-nos prazenteira e simpática à nossa circunstância de forasteiros. O povo alentejano é caloroso, sendo a sua abertura reconhecida por todos os que demandam para essas bandas. Há, no entanto, alguns «códigos» que devem ser respeitados e a sua intimidade dificilmente é exposta à curiosidade dos forasteiros, principalmente quando se trata de jornalistas. Há alguns esqueletos guardados no armário que a patine do tempo teima em fazer esquecer. E há uma mágoa guardada, bem escondida na vergonha sentida de um passado marcado pela ignomínia.

O latifúndio não foi, para os alentejanos, um mero sistema de desigualdade e injustiça na distribuição da propriedade a sul do Tejo. Foi mais que isso. Constituiu um punhal cravado na honra de cada homem e de cada mulher que, juntamente com a terra, foram propriedade de senhores poderosos. Não muitos decénios atrás, ao senhor da terra assistia uma espécie de direito ancestral a «tirar o cabaço» às raparigas. Para além da força de trabalho extenuada à jorna de sol a sol, a entrega tinha que ser total: a virgindade das moçoilas também havia de ser parte do inventário, da arrogância e da vaidade do agrário.

E importa falar destes tempos imemoriais para que se perceba toda a lógica de silêncios e cumplicidades que medra, ainda hoje, em terra alentejana. Uma terra e um povo de uma enorme religiosidade, ao contrário do que possa parecerem pela redutora análise política de movimentos sociais e influências ideológicas. Ao mesmo tempo, uma sólida consciência anticlerical perpassa a mente da maior parte das gentes, fruto de uma memória histórica que cola o clero à sombra das benesses dos poderosos e à guarda conveniente e afagadora dos poderes públicos. Salvo raras excepções, os padres não são benquistos das gentes alentejanas.

O roubo da inocência

Em fim-de-semana tórrido de há uma década atrás, Filipe (nome fictício) deixa as vetustas paredes do seminário para, com a alegria da sua puberdade inocente, ir passar o dia a casa de um benemérito, pessoa muito ligada à Igreja e à caridade, assim uma espécie de protector de pobres e desvalidos… Na herdade, a poucos quilómetros de Beja, quem vai para a aldeia de S. Brissos, esperam-no iguarias e senhores simpáticos. Apesar de lhe tocarem «nas partes» e lhe darem beijos repenicados e insistentes, o miúdo nunca por essa altura se apercebeu ser ele – e não os pretos servidos no repasto – a iguaria…

«Só tomei consciência de tudo quando, já adolescente, me apercebi que o carinho e afecto dos adultos não deve ter expressões dessas nas crianças», diz-nos Filipe. Ainda hoje, largado e seminário «pela incompatibilidade de vocação», casado e pai de filhos, este homem ainda jovem tem dificuldade em lidar com os seus medos, com esse lado obscuro de um passado que lhe roubou a inocência. Nunca mais passou pela herdade, que entretanto mudou de proprietários, e dificilmente nas suas idas a Beja consegue olhar, sem que uma lágrima lhe aflore o rosto, as paredes de uma sobriedade ostensiva em que se ergue o Seminário Diocesano de Nossa Senhora de Fátima (assim se chama com todas as letras, em rigor da verdade). É que, dentro dessas mesmas paredes, desses muros de silêncio cúmplice, foi também alvo da rapina libidinosa de quem usava «em vão o nome do Senhor» …

Silêncios cúmplices

Na cidade comenta-se, ainda hoje, esse passado negro da instituição secular e recordam-se os silêncios dos vários poderes. E fala-se das actividades de um sacerdote, responsável por uma instituição de acolhimento de estudantes, qual predador, que continua, pesem embora os escândalos de pedofilia na capital, a perseguir jovens e a seduzir meninos a troco de prendas, comprando a sua inocência e a sua pobreza. Todos sabem, todos calam, todos são cúmplices! – A começar peles autoridades, a quem estas actividades pedófilas não são alheias.

Pedro (nome fictício) também conheceu a herdade e, como Filipe, também ele saltitou a sua inocência no regaço de senhores muito beatos. Confrontado com factos, datas, locais e práticas que só quer esquecer, reagiu com um choro convulsivo e quase silencioso, ao mesmo tempo que o seu corpo se via possuído de um tremor antigo feito de vergonha e de dor. Continua ligado às coisas da Igreja, não seguiu o sacerdócio porque, entretanto, por altura da adolescência, a sexualidade despertou abrupta e vivificada, regeneradora mesmo, nos amores clandestinos de uma senhora mal casada. Separações consumadas, a dela com o marido, a dele com o passado – partilham um pequeno apartamento na margem sul do Tejo, mesmo ali em frente ao elefante branco que foi a Lisnave, berço de greves e lutas sociais. Pedro não fala, mas procura resgatar Cristo dessa ignomínia despudorada de sacerdotes que escondem velhos segredos pecaminosos nas franjas das sotainas…

Há muito tempo…

O actual reitor do seminário de Beja, padre Manuel Rosário, diz-nos: «Há dez anos atrás encontrava-me no estrangeiro». Curiosamente – ao contrário de parte substancial do povo da velha urbe alentejana -, desconhece «por completo o assunto» … E esta posição, ao mesmo tempo cautelosa e contraditória, ilustra a mundivivência da cidade e os silêncios que lhe subjazem. Em privado, longe de um comprometedor gravador ou de uma inconveniente máquina fotográfica, todos são unânimes em ratificar histórias de abusos e vilanias. Mas calam em público, numa cumplicidade negligente, o que é de seu foro privado, de conversas em família, ou em tertúlias de cafés da baixa.

A cidade, a bela Beja palco de tantas irreverências revolucionárias, cala-se à baixeza maior do rasgar das inocências e do desflorar das alegrias soltas desses «filhos do povo que nunca foram meninos». Pior do que a instituição latifundiária, causadora de tanta fome e de tanta dor, é essa memória antiga que todos – os das esquerdas e os das direitas – teimam em esconder nos armários.

A sociedade alentejana só se livrará do espectro lúgubre dos esqueletos que transporta na História quando, algum dia, se libertar do silêncio cúmplice de seus vícios privados. Filipe e Pedro são os primeiros heróis dessa missão histórica…

António Manuel Pinho

[in «O Crime», 1 Julho 2004]

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Guiné-Bissau

MIL defende
Força Lusófona de

Manutenção de Paz

Enquanto entidade sempre atenta ao que se passa em todo o espaço lusófono, o MIL tem acompanhado todas as convulsões que têm ocorrido no ainda frágil Estado da Guiné-Bissau.

Nessa medida, face às notícias dos últimos dias, que dão conta de mais uma tentativa de golpe de estado – com a detenção do primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, e do chefe de estado maior das Forças Armadas, Zamora Induta –, o MIL vem, uma vez mais, apelar à CPLP para que se empenhe mais no fortalecimento do Estado guineense.

Após a morte de Nino Vieira e da eleição de um novo Presidente da República, Malam Bacai Sanha, os vários órgãos de comunicação social – nomeadamente, em Portugal – procuraram dar uma imagem da Guiné que, como uma vez mais se comprova, não se adequa à realidade.

O Estado da Guiné-Bissau tem futuro, mas precisa do apoio de toda a Comunidade Lusófona. Recordamos, a este respeito, que o MIL propôs já, em devido tempo, o instrumento ideal para acorrer a situações como esta – uma “Força Lusófona de Manutenção de Paz”, com a participação de todos os países da CPLP, na medida das possibilidades de cada um, conforme o teor da Petição por nós lançada: http://www.petitiononline.com/mil1001/petition.html
.



MIL - Movimento Internacional Lusófono
http://www.movimentolusofono.org/

quarta-feira, 31 de março de 2010

Debates sobre a Democracia.III

Presidente condiciona passos...

Pedro Quartin Graça*

Os passos do novo líder do PSD estão condicionados. Para quem pensasse que Pedro Passos Coelho teria "luz verde" para executar a estratégia que defende para o PSD ou a moção política que resultar do próximo Congresso, desengane-se. Há quem, desde o primeiro dia deixe bem claro que pretende assegurar que o consulado de PPC esteja fortemente "vigiado", nem que isso implique, de vez, e curiosamente, o fim do actual Regime. Para as bandas de Belém, nesta República à beira de comemorar 100 anos, o valor supremo que o mais alto magistrado da Nação defende é... a "estabilidade". Ingenuamente pensei eu que o que mais interessava era a democracia, fosse ela em Monarquia ou em República. Mas há uns anos a esta parte, a democracia parece ser um dado adquirido na cabeça de alguns (atitude perigosa...) e o valor que mais alto se levanta agora é outro: a dita "estabilidade", a qual significa: paz podre, manutenção do status quo, na prática, o "deixa andar" que caracterizou as últimas décadas da jovem democracia portuguesa com os resultados que se conhecem.

É a segunda vez no passado recente que um líder partidário, curiosamente sempre do PSD, vê a sua acção condicionada por um Presidente da República. Foi o caso de Pedro Santana Lopes com Jorge Sampaio, que culminou no conhecido "golpe de Estado constitucional" que levou à dissolução da Assembleia da República e à queda do Governo e, agora, a propósito do malfadado PEC, Cavaco Silva com o novo Presidente do PSD, Pedro Passos Coelho. O Presidente pretende que PPC não trave o PEC "a bem da imagem externa do País". Ou seja, o que conta são as aparências, não interessa se a casa está ou não arrumada. Tem é de parecer que está, nem que o lixo se acumule todo debaixo dos tapetes. A reacção dos mais próximos do novo líder do PSD não se fez esperar. E estão cobertos de razão. Numa monarquia uma atitude deste tipo por parte do Chefe do Estado seria impossível. Aí "o Rei reina mas não governa" ou seja, ao Rei cabe a função de Chefe de Estado e representa a Nação, nomeadamente nas questões internacionais, o tal palco onde Cavaco pretende que tudo aparente "estar bem". É com atitudes como esta que o Regime se afunda. No que me toca fico encantado, mas que mete dó, mete. E vamos andando...


*Jurisconsulto, Presidente do Movimento Partido da Terra (MPT)
Artigo também publicado no Blog Corta-fitas

Foto:DR

Novas Farpas

A queda de um jornal
ou de um regime?
Simões Ilharco*

Não se trata da reedição da queda de um anjo, obra célebre de Camilo Castelo Branco. Longe de mim, tal pretensiosismo. Trata-se, sim, da queda de um jornal ou de um regime, de tal forma estão associados um ao outro. Falo do “Diário de Notícias”, onde trabalhei muitos anos, mas no qual, nos tempos que decorrem, não me revejo. Dele se diz, com alguma ironia, que está na Rotunda, mas não faz revoluções…

Fui saneado duas vezes: uma em 1975, por José Saramago, do PCP, e mais tarde Nobel da Literatura, o que me fez andar numa manifestação na Avenida da Liberdade a gritar o “Diário de Notícias” é do povo, não é de Moscovo; outra, em 1996, por Mário Bettencourt Resendes, do PS, o que comprovava já que, em matéria de saneamentos na comunicação social, os socialistas também têm rabos de palha e telhados de vidro. E de que maneira!

À data do 25 de Abril, o DN, em formato broadsheet, tirava 240 mil exemplares e as sobras contavam-se pelos dedos. A tiragem de hoje (números de Janeiro) ronda os 50 mil, quase cinco vezes menos, e bem há pouco, já com a actual direcção, situou-se nos 42 mil, o que constituiu o valor mais baixo da história do “Diário de Notícias”, que, como se sabe, é uma publicação centenária. O jornal i, que é um recém-nascido, apresentava, há dois meses, a mesma tiragem que o matutino da Avenida da Liberdade.

É caso para dizer que o DN caiu a pique! Afundou-se, quase com o aparato do Titanic… Sem contar com os desmandos do PREC, foi o bloco central (PS e PSD) que lhe cavou a sepultura. Nomearam para directores pessoas sem qualquer categoria profissional, que sem os partidos, ou seja, por mérito próprio, nunca teriam chegado onde chegaram – autênticos comissários políticos, alguns dos quais faziam mesmo censura, o que demonstra por A mais B que a que se faz hoje em Portugal é ainda mais insidiosa e sinistra do que a antiga. Isto porque, em primeiro lugar, surge como imprevista, e, em segundo lugar, imagine-se, é feita por colegas(!) de profissão, ao serviço dos grandes interesses políticos e económicos. Chamem-lhe pântano, lamaçal, lodo ou o que quiserem, mas a realidade (triste) tem estes contornos.

Não auguro grande futuro ao “Diário de Notícias”. Bem pelo contrário. O jornal está em queda livre, com um estilo gráfico e editorial que deixa muito a desejar, e a sua vocação situacionista rouba-lhe credibilidade. Outrora jornal de referência – até mesmo com algumas fases de grande independência que contrariaram o situacionismo, o que lhe granjeou prestígio e audiência – vira-se hoje mais para o tablóide, sem preocupações culturais. Infelizmente, não é mais do que uma publicação híbrida, ensanduichada entre o “Público” e o”Correio da Manhã”.

Apetece-me dizer em relação ao DN dos nossos dias, e talvez com mais propriedade, o que Arons de Carvalho disse de alguns noticiários da TVI: mete-me nojo!

*Jornalista


Foto: PEDRO CARDOSO

terça-feira, 30 de março de 2010

Debates sobre a Democracia.II

O texto é antigo, remonta a 2005, e foi redigido tendo em vista as Eleições Presidenciais desse ano. Pensamos, no entanto, que a génese das ideias aí defendidas revela uma flagrante actualidade e coloca no centro do debate o mesmo tipo de preocupações.
Assinado por António Pedro Dores, o documento é, paralelamente, a síntese de uma reflexão colectiva a que muitos nos entregamos.


Movimento para a IV República

Passou a ser lugar comum a noção de estarmos a viver uma crise de regime em Portugal. Todavia, não se vislumbram sinais de regeneração política, o que não pode deixar de estar nos fundamentos da acelerada ciclicidade das desistências e dos abandonos políticos, ao mais alto nível, e a persistência nos cargos de mais baixo nível, mais difíceis de escrutinar publicamente. A arrogância de quem se imagina capaz de, por si só, com a clique de amigos e com os apoios dos boys for the jobs, impor aos portugueses negócios inexplicados e, provavelmente inexplicáveis, alterna com a aparente impotência do Estado, também ela pouco transparente e muito selectiva.

A instabilidade política é, obviamente, induzida pela profunda corruptabilidade do regime. Apesar da avalancha de denúncias dos últimos anos, evidentemente, nada de essencial tem sido possível melhorar. Os partidos já sentiram necessidade de limpar as suas hostes, com evidentes dificuldades e com resultados nada claros. O sentimento de impotência não pode substituir a confiança na democracia. O sentimento de impunidade e os queixumes para saco roto – ou, pior, a perseguição dos denunciantes – corroem o orgulho que temos por Portugal, a vontade de sermos melhores portugueses, as expectativas de vidas melhores para os nossos pais e para os nossos filhos.

A alternância democrática foi capturada pelos arranjos políticos implícitos entre duas facções que parecem digladiar-se quando de facto cooperam na manutenção do estado das coisas. Sociais democratas para beneficiarem directamente dos fundos da coesão social da União Europeia, revelam-se, à direita e à esquerda, neo-liberais na distribuição desses benefícios no interior, estando Portugal com taxas de pobreza e taxas de desigualdade social das mais altas, analfabetismo crónico e iliteracia desgraçadamente única no espaço europeu, ineficiência dos processos de ensino e impedimentos organizados – e injustos – ao desenvolvimento educativo e profissional dos jovens, quando as taxas de desemprego de licenciados são enormes, num país com escassez de pessoas qualificadas. O trabalho, pela pobreza dos sistemas produtivos e da gestão de recursos humanos, ajuda a desqualificar uma mão-de-obra já de si desqualificada, num ciclo de enterra moral e cívica das potencialidades dos portugueses, que continuam a ser mais bem sucedidos lá fora do que reconhecidos no seu próprio país, para realização de uma estafada, miserável mas persistente política de exploração das vantagens competitivas do preço baixo do factor trabalho no nosso País.

Os portugueses têm razões para não acreditarem em políticos que se comportam como aristocratas ou como contabilistas. Até porque já lhes deram todos os créditos possíveis e imaginários, e vemos agora no que resultou. Não está em causa a sinceridade ou a perversidade com que sempre são desenhadas políticas que mexem com interesses. O que está em causa é a necessidade inadiável de mudar de rumo, democraticamente, o que manifestamente tarda e não parece possível com o actual regime. Há pois que ir mais fundo na exploração das potencialidades democráticas e aprender com outros povos mais experientes democraticamente como se podem ultrapassar politicamente crises de nó cego como aquelas que estamos a viver.

Procura-se quem represente e suporte a vontade dos portugueses de se mobilizarem democraticamente para as tarefas de produção de uma nova estratégia capaz de colocar o país com capacidades proactivas e inovadoras no mundo global em que estamos inseridos, em benefício dos portugueses e do bem estar para quem viva em Portugal. Essa mobilização não pode deixar de ser radicalmente crítica em relação à intolerável tolerância da cunha e da prateleira, do uso dos dinheiros públicos para distribuir pelos correligionários e pelos arrivistas colectores de financiamentos políticos, do desleixo na colecta de impostos e de organização da segurança social – que se anuncia velhacamente falida aos que dela esperavam que cumprisse o contrato que, entretanto, beneficia (escandalosamente) quem nada deveria poder esperar desse seguro social dos trabalhadores portugueses.

Pode caber à Presidência da República abrir debates e dar voz à vontade e às iniciativas de todos os portugueses, e não apenas aqueles que prometem a árvore das patacas ou agricultura biológica das revistas cor-de-rosa. Pode caber ao Presidente da Republica servir a autonomia das instituições políticas, a consonância dos seus comportamentos relativamente à vontade dos Portugueses e não aceitar quaisquer interferências do Sr. Cunha, sejam elas veiculadas por amigalhaços ou por partidos inteiros. A justiça – aquela que é produzida pelas instituições judiciais e a outra, mais difusa, gerada pelo ambiente político e pelas políticas concretas quotidianas – deve ser sistematicamente escrutinada e não apenas para efeitos mediáticos ou para entreter os telespectadores. Não faz nenhum sentido entregar a resolução dos problemas estruturais da justiça portuguesa às corporações e às personalidades que construíram e beneficiaram – e continuam a beneficiar – da injustiça que campeia descarada e impunemente. Não é aceitável que bons desempenhos profissionais sejam postos em causa por um sistema de profunda interferência política na administração do Estado, que arreda toda a possibilidade de demonstrações de mérito e, para isso mesmo, faz circular o pessoal de confiança, em alta velocidade, por todos os milhares de lugares disponíveis, tornando impossível qualquer tipo de avaliação de desempenho administrativo e político.

Pode caber ao Presidente da República trazer os portugueses a construírem o Portugal do século XXI, já que o que também está em causa, no magma da globalização e das políticas europeias, é saber o que os portugueses querem ser no futuro: os herdeiros de uma língua e cultura minoritária e folclórica para vender aos turistas da terceira idade? Ou um povo que, mais uma vez, será capaz de dar novos mundos ao mundo, de encontrar caminhos novos para a justiça social, nos quadros financeiros e demográficos que são conhecidos mas em quadros políticos e sociais que temos oportunidade de, com a nossa vontade colectiva, encontrar democraticamente. Para atingir esses objectivos é indispensável começarmos de imediato a alterar comportamentos, nomeadamente a sermos exigentes connosco próprios e não aceitarmos mais entregar os pontos a quem nos melhor garante que não nos incomodará – até porque a experiência mostra como nos enganamos frequentemente nesse juízo. Temos que exigir de nós mesmos, e em primeiro lugar às instituições, que as denúncias e as queixas que chegam à administração serão tratadas em tempo útil, conforme a lei, e de modo empenhado e sério, em vez do velho sacudir de água do capote. Para que serve votar num candidato a Presidente da República com responsabilidades na estruturação de um regime que, manifestamente, caiu da cadeira, sem lhe pedir uma avaliação específica e criteriosa do que nos trouxe a este beco? Para assistirmos ao fecho de mais saídas para o regime? Para adiarmos para amanhã o que se pode começar a fazer hoje?

Não! Não somos todos responsáveis pelo estado a que chegámos! Os que lutam por sobreviver, aqueles a quem não são reconhecidos os seus direitos e que confrontam com os esquemas kafkianos montados pelo tráfico de influências e pela corrupção, os que são humilhados por querem denunciar situações ilícitas são igualmente responsáveis, se comparados com aqueles que recebem reformas ilegítimas para que possam continuar a acumular benesses e manterem a culpa solteira? Nestes trinta e um anos de democracia, houve quem desse tudo, incluindo o bem estar pessoal e das respectivas famílias, para melhorar Portugal e também houve os que só pensaram em si mesmo, nos seus pergaminhos e nas conjuras que fossem necessárias para não terem obstáculos à afirmação das suas irresponsáveis convicções, ao ponto de o povo confundir os bem intencionados e os mal intencionados de entre os vencedores destas competições organizadas pelo Sr. Cunha.

Não! Não somos todos responsáveis pelo estado a que chegámos! Os responsáveis não podem continuar irresponsáveis.


5 Setembro 2005

António Pedro Dores


Foto: JJ LUZIA HENRIQUES

Debates sobre a Democracia

Haverá liberdade em Portugal?

António Pedro Dores*
antonio.dores@iscte.pt

Parece absurda a pergunta. Pelo menos para a grande maioria de nós que não foi incomodada por falar. Tal como no regime anterior, a maioria de nós ainda que quisesse dizer alguma coisa teria dificuldades. Por não saber como. Por falta de escolaridade, por falta de cultura, por falta de experiência de debate, por falta de liberdade, numa palavra.

E sofre-se com isso? Ou, ao contrário, é-se mais feliz por ignorar e não querer saber? Como na canção, o melhor é não nos preocuparmos porque isso só vai aumentar os problemas? Os dados comparativos sobre doenças mentais não enganam: o dobro dos portugueses sofrem desse tipo de doenças quando comparados com outras nacionalidades do sul da Europa. E são sobretudo as mulheres que sofrem de ansiedade.

Será por falta de liberdade?

A ter em conta que apenas recentemente passou a ser possível em Portugal denunciar publicamente a violência doméstica e os abusos contra crianças, pode bem-estar aqui uma parte da explicação. Sabe-se também que as mulheres em Portugal trabalham tanto como as nórdicas e são aquelas que mais trabalham, o que aparenta um contraste com o conservadorismo noutras áreas. Quer dizer: para pormos as mulheres a trabalhar, sobretudo pagando-lhes menos que os homens mas pagando mal a ambos e estimulando uma sociedade consumista, nesse campo não somos conservadores. O que é uma oportunidade para elas escaparem à dependência tradicional através do trabalho (como do estudo). Fazem-no pela calada, sem grandes alardes – porque se lembram do que aconteceu no Parque Eduardo VII, em liberdade pós-25 de Abril, à primeira manifestação feminista em Portugal: foram cercadas de homens com cio. Não o fazem sem custos, portanto. Entre os quais a discrição e sempre mais trabalho.

Provavelmente uma das causas e consequências de tal depressão é a taxa de natalidade sustentada e cronicamente abaixo da capacidade de reposição da população – que continua a somar-se, outra vez de forma dramática nos últimos anos, com a emigração. Não há quem aguente. Como dizem mais de um terço dos portugueses inquiridos, passar a integrar o reino de Espanha não seria má ideia.

No parlamento, por hesitante iniciativa do PSD, com apoio sobretudo do Bloco de Esquerda – com a oposição do PS – e por imposição dos factos (de facto a roubalheira está em fase de profissionalização oficial), dada a corrupção reinante, as tendências desreguladas para a concentração dos órgãos de comunicação social, os ataques à autonomia da classe dos jornalistas, discute-se a liberdade de imprensa. Uns dizem que o governo conspira (que haveria ele de fazer?) outros dizem que acham bem que assim seja e que isso é democrático (será que também eles conspiram?). Sobre a liberdade de expressão, nem uma palavra. Sobre a vida do povo, um manto de silêncio: sobre a falta de educação e de respeito por iniciativas populares, seja a nível autárquico onde reina o caciquismo, seja a nível político onde reina o tráfico de influências, seja nível legislativo onde mandam as “vírgulas” e proliferam as leis com alçapões, seja a nível da banca onde se digladiam seitas secretas pelo controlo das finanças e do governo, seja a nível cultural, tanto nas universidades – que continuam sem bibliotecas – como nos museus, nos teatros, na música, na literatura, na filosofia, nas escolas, a censura tem a forma de invejas, tropeções, perseguições administrativas, abusos de poder. Mas não deixa de ser esta censura que remete para o estrangeiro milhares de licenciados à procura de respeito pelo seu trabalho e pelas suas pessoas, lá onde a liberdade possa ser coisa mais sentida e reconhecida.

Portugal não sabe o que seja a liberdade. Porque das raras vezes que lutou por ela não quis morrer por isso; preferiu acomodar-se a conceitos perversos sobre o que isso seja. Liberdade não é cada um fazer o que lhe apetecer; mas também não é encolhermo-nos de cada vez que alguém mais poderoso manifesta incómodo pela nossa existência. Liberdade é cada um assumir a dignidade da sua identidade auto-determinada e auto-construída, plantada e mantida como um jardim para benefício de todos e da sociedade. Liberdade é o respeito que devemos aos outros, tal como reclamamos que nos respeitem a nós, independentemente do que cada qual entenda ser melhor para si e para todos os outros, incluindo a liberdade de lutar pelas suas convicções.

A liberdade tem consequências: o reconhecimento dos méritos e também das derrotas. Mas tem defesas: a dignidade de todos e cada um é sobretudo a defesa da dignidade alheia. Nesse país não poderia ser dito, como eu ouvi dizer aqui, que embora haja gente a viver com salários de trabalho indignos, tais salários vão ter de baixar em nome da economia.

Só a falta de liberdade explica ser pensável avançar com tal argumento. Só a falta de liberdade permitiu a sua repetição metralhada, sem reacção. Só a falta de liberdade permite dizer-se que há liberdade de expressão em Portugal.


*Sociólogo, Professor Universitário
http://iscte.pt/~apad/novosite2007/

sexta-feira, 19 de março de 2010

A violência policial continua impune

Foi hoje [ontem] a enterrar Nuno Rodrigues, mais conhecido no meio artístico como MC Snake que caiu sob as balas da PSP na madrugada de domingo para segunda-feira, por alegadamente ter “desrespeitado sinais regulamentares de paragem de uma operação stop”, segundo a versão oficial da polícia.

A morte de Nuno Rodrigues relança com uma urgência inadiável a necessidade de um debate sério sobre a violência policial. Nos últimos dez anos, foram dezenas as mortes de jovens dos bairros nas mãos da Polícia de Segurança Pública, sem que isto tenha acarretado nenhuma consequência para os criminosos.

O Estado português tem seguido a politica da avestruz, enfiando a cabeça na areia par não ver a realidade nua e crua dos rastos de mortes que a actuação das forças de segurança vai semeando nas comunidades socialmente mais marginalizadas.

Numa democracia que se preze, nenhuma autoridade, seja ela policial ou judicial pode decretar a pena de morte por desobediência! Mas foi o que aconteceu com o Nuno e já aconteceu com muitos outros jovens dos bairros pobres!

A sentença de morte do Snake e de tantos outros que já sucumbiram às balas da policia está inscrita no preconceito racista e na impunidade que grassam nas instituições em geral e, na PSP em particular. À segregação espacial, social, económica e sobretudo cidadã a que estão votados estes jovens juntam-se inaceitavelmente as frequentes execuções sumárias da polícia!

Já tivemos o Tony, o Kuku e tantos outros e, como que uma fatalidade e curiosamente são todos jovens dos bairros sociais que caíram das balas da policia!

E à cada violência policial que resulte em morte, as autoridades aparecem sempre com justificações oficiais que, além de falaciosas, são insultuosas para dignidade humana. Já ouvimos de tudo da sua boca, desde da inexperiência que foi agora invocada até, pasme-se, do desconhecimento do “ carácter letal” das armas usadas!

Os números da IGAI, ontem divulgados pela imprensa, sobre as mortes que resultam da actuação das forças de segurança não só colocam Portugal na triste lista dos países europeus com mais mortes na sequencia de perseguições policiais, como estão longe de evidenciar a dura realidade da violência policial sistema contra os jovens nos bairros! De certeza, que não constam destas macabras estáticas as mortes por espancamento em esquadras ou nas zonas menos iluminadas dos bairros e/ou por despiste após frequentes perseguições de carro.

Esta última morte, além de exigir um apuramento dos factos reais e das consequentes responsabilidades judiciais, obriga a uma resposta politica que não tem existido por parte do Estado português. O cinismo político com que o Estado português tem gerido este flagelo da violência policial exige uma mobilização de tod@s para criar os mecanismos que permitam conhecer, divulgar e fiscalizar todas as arbitrariedades cometidas pelas forças de segurança. O papel do Estado é garantir a segurança a tod@s e não se transformar num foco de insegurança para determinadas camadas sociais da sociedade, por apenas serem diferentes, como tem vindo a acontecer nos últimos anos e de que a morte do Nuno Rodrigues é a maior evidência.

SOS RACISMO

18-03-10

Pela Liberdade de Imprensa

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