A Fiscomania e a Revolução de 1846
Pedro Leitão
Jornalista
privado.pleitao@gmail.com
A fiscomania é uma doença que atinge os governos de costela anti-popular, isto é, que não pensam no estado real do povo laborioso. A excessiva pressa em aumentar e cobrar impostos costuma ser o primeiro sintoma da fiscomania. Outro sintoma frequente é a tentação de fazer pesar sobre os fracos o fardo fiscal, tudo em nome da lei, que nem sempre pode ser cumprida, quando a realidade assim o demonstre em cada momento concreto.
Mas os fiscómanos, cegos pela doença, nunca enxergam a realidade, e exigem que se cumpra o que, em determinadas conjunturas, não pode ser cumprido, nem à risca, nem à rasca.
No nosso país, a fiscomania está diagnosticada há 163 anos. O primeiro portador da doença foi António Bernardo da Costa Cabral: manifestou-a quando tentou cobrar pesados impostos a bolsos vazios. Impiedosamente.
A Revolução do Minho de 1846, desencadeada pelas classes laboriosas da lavoura contra o alto funcionalismo nutrido, encarregou-se de lhe tratar da «saúde», atirando-lhe à cara as papeletas da «décima», após a invasão tumultuosa de cartórios e repartições. Nem os paninhos quentes do arcebispo de Braga foram suficientes para conter essa insurreição, que pôs o país a ferro e fogo.
A erradicação da fiscomania nunca foi conseguida em 160 anos. Ainda assim, houve momentos menos propícios a perigos de contágios e até se cuidou que não haveria mais estragos do que aqueles que já provocara. Porém, reapareceu em força nos últimos quatro anos, e não há meio de abrandar ou de ter um fim.
Parece-nos que o actual governo também foi vítima de contágio, e até suspeitámos que seja agora um fiscómano em fase terminal. Pelos delírios, pressentimos nele a doença. A obstinação é tanta que já não vê o que um cego consegue ver, só de ouvir: que andou quatro anos atrás de bolsos vazios dos pequenos contribuintes, depauperando-os, a pretexto da redução do défice, mas que, afinal, podia ter diminuído com uma fiscalização apertada sobre os mil milhões de Euros que escaparam para paraísos fiscais. Em 1846, a revolta rebentou como rebenta um dique. Hoje é a cultura da rendição que a «estanca». Até ver…
SP Nº5, 29 Julho 2009
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Comentário muito bom que aplica-se aqui também no Brasil.
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