António Manuel Pinho
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E tomou posse. Entre mesuras e rapapés, José Socrates assumiu funções na chefia do 18º governo constitucional. No discurso de investidura, o repetente primeiro-ministro, entre o «animal feroz» e o «cordeirinho», lá foi dizendo às «ilustres personalidades» presentes – e ao País que o ouviu nas televisões – que ia manter o rumo.
No cabeleireiro, onde me encontrava, o seu discurso não provocou nenhuma reacção entre as cabeleireiras presentes e não senti, na cirurgia do corte, nenhuma oscilação ou tremura na mão da senhora. Ao mesmo tempo, na rua, ouviu-se o latido de um cão e o chiar ronfeiro da carrinha que passava. E pareceu-me, ali no aconchego da poltrona do salão, que os portugueses pouco teriam ligado aos discursos e ao verniz presidencial.
À entrada do local de investidura, repórteres tolos - ou que reproduziam as tonterias de editores e chefes de redacção, de directores e outras aventesmas - faziam a pergunta engatilhada e patética: «O governo é para durar 4 anos?» Como se esse fosse o principal problema do «país real», quando o que seria aceitável e [exigível] era perguntar que políticas iriam ser seguidas.
Sócrates, tenho quase a certeza, aposta num governo até final de legislatura, eleitoralista q.b. E, em caso de «aperto», sempre poderá contar com os bons préstimos de Portas ou o pontual anuír de Louçã. Porque, ao que parece, serão estes dois partidos que irão ser a charneira dos interesses socratinos. Isto é, se entretanto Passos Coelho não conseguir catapultar-se a líder laranja... Porque aí a coisa muda de figura, pois toda a gente percebeu que, no PSD, manobram interesses ocultos apostando no perpectuar, agora com honras de coligação, do «centrão» que, como já se percebeu também, seria do agrado de barões e da malta do negócio – pontificando aqui a figura tutelar de um ex-ministro laranja muito ligado a interesses económicos obscuros, mexendo os cordelinhos, influenciando aqui e ali...
O que esperar deste governo? Eu não espero nada! E até aposto que, em caso de desnorte de Sócrates – não se confirmando o cenário que tracei, e ressurgindo o «animal feroz» -, a «maioria silenciosa» que lhe deu o voto encherá as ruas protestando. Para, logo a seguir, alegremente bisar o voto e a pose de carneiro.
ED Nº18, 28 Outubro 2009