domingo, 16 de agosto de 2009

Trabalhadores denunciam mais um escândalo

O LADO NEGRO DA TAP

Trabalhadores «convivem» com baratas e ratos. Dormem na empresa porque não têm subsídio de transporte. E são vítimas de 200 acidentes de trabalho por mês. Tudo isto testemunhou o SP na semana em que foram conhecidos os salários milionários da administração Fernando Pinto

Lado a lado com os salários milionários dos gestores da TAP, e demais regalias atribuídas aos administradores da transportadora aérea portuguesa, existe um cenário negro, que está a indignar os funcionários do aeroporto de Lisboa.
Na semana em que os sindicatos do sector denunciaram a aquisição de 42 novos carros para directores da companhia, o SP dá voz «à revolta» dos operadores de «handling» (assistência em terra) que testemunham «as condições miseráveis» nos seus postos de trabalho. Instalações degradadas, em alguns casos desadequadas à prática profissional e sem requisitos de limpeza dignos, são algumas das críticas apontadas.Os funcionários garantem que «convivem» diariamente com baratas e ratos, pondo em causa a saúde pública; que chegam a passar sede porque não há distribuição de água na «placa» do aeroporto; e que há operadores a dormir nas instalações da empresa para poupar dinheiro nos transportes.
«Depois da situação ter sido resolvida em Lisboa, temos informações de que no aeroporto de Faro a água é sonegada aos funcionários, e estamos a falar de temperaturas que atingem 40 graus no pico do Verão», acusa um dos elementos da Comissão de Trabalhadores (CT) da Groundforce – empresa pertencente ao Grupo TAP, que presta a assistência ao transporte aéreo nos aeroportos de Lisboa, Porto, Faro e Funchal.
«Nos balneários observamos as péssimas condições de higiene: baratas monstruosas, inundações diárias, a caldeira que esteve sem funcionar vários meses seguidos, e tudo isto é secundário para uma administração que, ao mesmo tempo, passa temporadas em hotéis de luxo, dias a fio, com jantaradas incluídas», lamenta Fernando Henriques, coordenador da CT.
«A precariedade chegou a tal ponto, com aposta na subcontratação, que a escravatura da era moderna obriga dezenas de Operadores de Assistência em Escalada da Groundforce (com salários abaixo do ordenado mínimo) a dormir nas instalações do aeroporto para pouparem dinheiro em transportes», acrescenta.

962 acidentes de trabalho em 2008

Os funcionários dos Serviços Portugueses de Handling (SPdH) equiparam as suas condições de trabalho aos países subdesenvolvidos e denunciam a «escandalosa» falta de equipamentos e de meios.
«Temos tapetes, tractores e loaders (veículos para transportar contentores e paletes) com vinte anos, todo o material é escasso, obsoleto e não é renovado, o que potencia centenas de acidentes de trabalho por mês», recordam os membros da CT ao testemunhar: «Há cerca de dois anos uma escada que estava podre cedeu, caiu um passageiro de uma altura de três metros, temos colegas que ficaram tetraplégicos e outros que regularmente partem pernas, braços e ficam com deficiências graves».
Só no ano passado, segundo dados da CT da SPdH, ocorreram perto de mil acidentes, mais concretamente 962 no universo de 3000 trabalhadores. Em toda a escala da Groudforce, a média é de 200 acidentes por mês, e de ano para ano os acidentes têm vindo a aumentar. «Não é difícil chegar a estes valores quando trabalhamos com falta de pessoal e de material e estamos sujeitos a uma pressão enorme».


A azeitona e o caviar

«Afronta», «imoralidade», «vergonha». Estas são as palavras que as duas Comissões de Trabalhadores do Grupo TAP utilizam para classificar os rendimentos dos administradores da empresa presidida por Fernando Pinto.
«Bons salários, bons prémios, excelentes carros e ajudas de custo para tudo, para nós resta sempre o carimbo da crise», diz indignado Vítor Baeta, da CT da TAP.
Em tempos de crise a administração «não atacou outros compromissos contratuais com alguns dos seus quadros considerados o caviar», rematam os trabalhadores ao recordar uma frase proferida por Fernando Pinto, durante uma recente reunião onde estiveram presentes. «Prefiro retirar uma azeitona à classe económica que o caviar à classe executiva», terá dito o presidente da companhia aérea.
O SP tentou ouvir a administração da TAP. Até à hora do fecho da edição não nos chegou qualquer resposta por parte do gabinete de Relações Públicas e Comunicação.



Isabel Guerreiro (Texto)
Xana Duarte (Foto)


Os luxos da gestão Fernando Pinto

> «Excursão de trabalho» ao Brasil. O SP sabe que, no mês passado, algumas dezenas de quadros da área dos Recursos Humanos do grupo TAP rumaram a Belo Horizonte para participarem numa acção de formação, com direito a pagamento integral das despesas. Estima-se que o custo total da «semana de trabalho» terá atingido os 70 mil euros. Os trabalhadores questionam que ganho obteve a TAP com tal medida. Consta que foram tomadas decisões de alteração do organigrama da empresa mas que acabaram por não ser concretizados porque o Conselho Geral não autorizou. Como o SP apurou, paralelamente existem operadores de escala (com vencimentos abaixo do salário mínimo) a pagar do seu bolso acções de formação profissional que podem chegar aos 960 euros.
> Salários milionários. Apesar da administração desmentir, as estruturas sindicais do sector continuam a frisar que os rendimentos declarados por Fernando Pinto em 2008 totalizaram «816 mil euros, duplicando os de 2007», e que as despesas com salários dos membros dos órgãos sociais do grupo TAP ascenderam a «3,88 milhões» de euros em 2008, «mais de 17 por cento em relação a 2007». Um comunicado interno da administração garante que «os prémios relativos a 2006 só foram pagos em 2008, pelo que apenas na declaração de rendimentos deste ano foram incluídos»
> €1 milhão para carros de administradores. Junto ao edifício 25 e Museu TAP podem ser vistas as novas viaturas da polémica. A compra de 42 automóveis top gama de marca Citroen para os directores da transportadora indignou os trabalhadores. Segundo a TAP, a substituição de viaturas de serviço vai permitir uma poupança de 199 mil euros nos próximos quatro anos. «Para uns continuarem a comer camarão, os outros trabalhadores se calhar nem uma sopinha vão poder saborear», diz a CT da Groundforce, ao garantir que a poupança de 200 mil euros equivale a gastar, nesses mesmos quatro anos, mais de um milhão de euros. (30 mil euros x 42 viaturas = €1 milhão de euros). Este valor não inclui os gastos com os motoristas particulares do presidente do Conselho de Supervisão, Manuel Pinto Barbosa, e do próprio Fernando Pinto.
> €220 mil para alojamento de 4 administradores. O subsídio de alojamento atribuído a Fernando Pinto, assim como aos seus colegas brasileiros do Conselho de Administração é de 54 mil euros por ano. Só em despesas de alojamento, os administradores Michael Conolly, Luíz Mor, Manoel Torres e Fernando Pinto custam à empresa 220 mil euros. No entanto, houve uma proposta da administração para acabar com os subsídios de transporte dos funcionários que iniciam funções antes das 7 da manhã. Os trabalhadores suspeitam que Fernando Pinto já tem dupla nacionalidade e garantem que o presidente da TAP comprou uma casa na Beloura, Sintra, onde vive. Consta nos bastidores, que quando o gestor trocou o Brasil por Portugal também a mulher, professora universitária, «recebia um 'subsídio de inserção social' equivalente a 3 mil euros».
> Directores aumentam. Desde a entrada de Fernando Pinto na administração da TAP, em 2000, os directores da empresa passaram de 5 para 30.
> «Gestão ruinosa». Segundo a CT da SPdH, as quatro empresas de subcontratação (Kelly, Omniteam, Adecco e Carristur) custaram à empresa 11 milhões de euros (em 2008 e 2007, respectivamente). «Numa empresa que espera 30 milhões de prejuízo este ano (Groundforce) há 13 salários milionários acima dos 5 mil euros/base», sublinha a CT ao acrescentar: «Em 2006 foi comprado um sistema informático a uma empresa suíça, que custou 2 milhões de euros, o chamado INFORM era para estar operacional em 2007, mas continua sem funcionar na íntegra e só contribuiu para a duplicação de chefias». Os trabalhadores que acusam a administração de «gestão ruinosa» temem ainda que a recente redução do capital social de 8 milhões de euros para meio milhão «é um sinal de que a Groundforce caminha para a insolvência». Talvez só depois das eleições de Setembro para não criar conflito social, prevêem.


IG
Milhões de prejuízos

> Recorde-se que a transportadora aérea TAP registou um prejuízo de 72,4 milhões de euros no primeiro semestre de 2009. No ano passado e fruto da crise internacional a TAP apresentou prejuízos de cerca de 285 milhões de euros.
No entanto, a Comissão de Trabalhadores da TAP entende que os números revelados pela companhia não incluem todos os custos da totalidade das empresas do grupo. A CT considera que ficaram por contabilizar vários encargos mensais da transportadora, nomeadamente os empréstimos de leasings, os custos que a TAP está a ter com empresas como a manutenção e engenharia no Brasil (VEM), a PGA e os serviços portugueses de handling.
«O único aspecto interessante da administração Fernando Pinto foi alterar a imagem externa da companhia que era bastante má – aí jogou o marketing – e relançar a nossa rede com a abertura da base do Porto ao longo curso…. e não tenho imaginação para mais!», ironiza Vítor Baeta. «A imagem externa é apenas marketing mas os problemas dentro da empresa são bastante diferentes», conclui.


IG
SP Nº7, 12 de Agosto 2009

1 comentário:

  1. Gostaria de agradecer ao Semanário Privado a oportunidade de finalmente dar voz a quem realmente trabalha nesta empresa. O meu sincero Obrigado!

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